Quinta-feira, 02 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 30 de dezembro de 2024
Não é fácil desacelerar a economia brasileira, mas o Banco Central aumentará os juros igual ou acima do nível do governo de Dilma Rousseff, 14,25%, quando o IPCA era muito mais alto (acima de 10%), para tentar acalmar uma inflação que pode romper o teto da meta pelo segundo ano consecutivo.
O vigor das atividades econômicas, que levaram o PIB para perto de 3,5% no ano, não deve sofrer um freio abrupto. A desaceleração dos salários, do mercado de trabalho e do consumo ocorrerá mais lentamente no primeiro semestre para se tornar mais efetiva no segundo. As projeções do governo e analistas privados convergem para algo entre 1,8% e 2,5%, estimativa que coincide praticamente com a da capacidade potencial de crescimento da economia.
A maxidesvalorização do real (27%) mudou para muito pior tanto as expectativas inflacionárias quanto o nível de aperto monetário que o BC terá de fazer para domar a inflação. Mesmo com a alta da taxa Selic a 12,25% e a promessa de chegar a 14,25% em março, apenas no terceiro trimestre do ano que vem o IPCA cairá abaixo do teto de 4,5%. O dólar mudou de patamar e a maioria delas coloca R$ 6 por dólar como média. A depreciação do real acelerou muito a partir de novembro, o que indica que o repasse aos preços pode ter um longo caminho à frente, se a alta do dólar não for sancionada pela demanda.
A demanda, por seu lado, teve comportamento exuberante no ano, impulsionada pelo aumento da massa salarial, dos salários e da mão de obra empregada. A Pnad Contínua mostrou que a média do desemprego do trimestre encerrado em outubro é a menor da série histórica, iniciada há 13 anos: 6,1%. O salário médio habitual real no ano até novembro evoluiu 3,4%, e já está perdendo para a corrida dos preços – o IPCA acumulou 4,29% até o mês. Mas o avanço da massa de rendimento real habitual é bem maior, 7,2% no mesmo período, e o total de rendimentos é recorde (R$ 332,7 bilhões mensais), com acréscimo de R$ 22,5 bilhões. Os indicadores iniciais do último trimestre do ano não apontaram até outubro perda de fôlego. A produção industrial caiu 0,2% no mês em relação ao anterior, mas exibe bom desempenho ante outubro de 2023 (5,8%) ou no ano, 3,4%.
Os serviços, no entanto, apresentam taxa de expansão quase “chinesa”, e a inflação do setor, segundo o Banco Central, que já era incompatível com a meta de inflação, voltou a subir. Nos doze meses até outubro, a taxa de expansão é de 7,4% e no ano, de 7,8%. Contra o mesmo mês do ano passado, atinge 9,6%. Pela Pnad Contínua, os serviços lideram as contratações, com transporte e armazenagem (5,8%), outros serviços (5%) e informação e comunicação (4,4%). O segmento de transportes, armazenagem e correio lidera em aumentos salariais, tanto na comparação com o trimestre de 2023 como com o anterior deste ano (4,7%). O comércio, um dos maiores segmentos de serviços, acumula alta de 8,8% no ano até outubro e o varejo ampliado, que inclui carros e construção, 7,9%.
Crédito
Além dos salários, o aumento do crédito manteve-se na casa dos dois dígitos boa parte do ano. Até novembro, em 12 meses, o estoque subiu 10,7% e, para pessoas físicas, 11,8%. No entanto, as concessões apresentaram recuo no mês de 0,7%, e esse é o sinal de por onde a política monetária freará a oferta de dinheiro que está irrigando o consumo. Em 12 meses as concessões cresceram 14,5%. O BC, em seu relatório de inflação de dezembro, estimou um avanço de 9,6% no estoque em 2025, o que não parece uma desaceleração compatível com a perda de ritmo que se quer impor à economia.
O outro componente do forte crescimento da economia, o gasto público, deve ter expansão menor no ano. Embora mais comedido, haverá algum aumento de despesas. O Prisma Fiscal estima que em 2024 o governo terá um déficit primário de R$ 62 bilhões na média, que se elevará para R$ 92,2 bilhões em 2025. A decisão por um ajuste fiscal pífio em novembro, que provocou alvoroço nos mercados, indica que o presidente Lula não está convencido de que uma ação fiscal vigorosa poderia reduzir rapidamente a inflação (que para ele está contida) e manter uma expansão sustentável.
A deterioração das expectativas, em contraste com o vigor da economia, provavelmente conduzirá o aperto monetário até 2026, ano eleitoral. A expectativa de recessão, prevista várias vezes e não realizada, continua pouco provável. O cenário visto de hoje é de um PIB ao redor de 2% nos próximos dois anos, se não houver turbulências nos mercados globais. O ideal seria que a política fiscal ajudasse agora, em momento delicado, a política monetária.