Sábado, 28 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 31 de julho de 2019
O Senado do Paraguai aprovou uma medida que rejeita o acordo assinado pelo governo do presidente Mario Abdo Benítez sobre a venda do excedente de energia produzida pela usina de Itaipu para a Eletrobras.
Antes disso, Assunção havia dito que pediria ao Brasil a anulação do texto e uma nova reunião entre sua estatal de energia, a Ande (Administración Nacional de Electricidad), e a empresa brasileira para rediscutir os termos.
A crise aberta pela assinatura, em 24 de maio, do acordo entre os dois governos também resultou na renúncia do chanceler paraguaio, Luis Alberto Castiglioni, do embaixador do país no Brasil, Hugo Saguier, e do presidente da Ande, Alcides Jiménez.
1) Qual a origem do problema?
Itaipu é uma hidrelétrica binacional criada por um tratado assinado em 1973 e que começou a produzir energia elétrica em 1984, com administração dividida entre Brasil e Paraguai. Cada país tem direito a 50% da energia, mas o tratado determinou que o Paraguai, com um mercado interno muito menor, tem que vender ao Brasil o que não consome da sua metade — a chamada “energia adicional”.
O Brasil retém boa parte do pagamento pela energia adicional para abater o empréstimo feito ao Paraguai para integralizar a sociedade na construção de Itaipu e investimentos posteriores.
Em 2009, os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Lugo, hoje senador, fecharam um acordo que triplicou de US$ 2,81 para US$ 8,43 por megawatt-hora o valor que o Paraguai recebe efetivamente pela energia adicional.
Além disso, existe a chamada “energia excedente”, a produzida acima da potência oficial de Itaipu em razão de chuvas fortes e reservatórios cheios. Esta energia é mais barata por não incluir juros sobre a dívida da usina nem impostos. Em 2007, o Brasil deu ao Paraguai o direito de usar uma proporção maior da energia excedente.
Isso ajuda o Paraguai, país que não tem saída para o mar, a baratear os custos de suas empresas. Já a chamada “energia garantida” é a que não se enquadra nas duas categorias acima e tem preço igual para os dois países.
Com esses arranjos, o Brasil acaba pagando mais em média pela energia de Itaipu e a conta de luz no país vizinho é menor.
2) Qual é a queixa do governo brasileiro?
O Brasil reclama da declaração feita pelo Paraguai da energia garantida que consumirá anualmente, afirmando que o vizinho tem declarado menos que o consumo real, já que conta com a energia excedente. É com base nessa declaração, no entanto, que o Brasil paga ao Paraguai pela energia adicional, um custo que acaba absorvido pelos consumidores brasileiros.
3) Do que trata o acerto feito em maio entre Brasil e Paraguai?
O acerto tenta resolver o descasamento da energia declarada e a de fato consumida pelo Paraguai, e a assimetria entre os preços pagos por cada lado. Pelo acerto, que resultou em uma ata assinada pelas duas Chancelarias, o consumo declarado pelos paraguaios aumentaria gradualmente até 2022. O Paraguai afirma que a ata não tem valor jurídico, e o Senado paraguaio votou por sua rejeição.
A oposição acusou o presidente Mario Abdo Benítez de traição à Pátria, chegando a falar em impeachment.
4) Qual a consequência do acerto para os paraguaios?
Mais de 90% da energia consumida no Paraguai é gerada pela hidrelétrica de Itaipu, e por isso qualquer alteração nas regras tem impacto substancial na tarifa paraguaia, o que provocou protestos no país. No Brasil, cerca de 15% da energia consumida é gerada por Itaipu, e o impacto nos preços é diluído.
5) Por que o assunto ganha urgência?
A reação do Paraguai ao acerto de maio antecipa a renegociação do Tratado de Itaipu, prevista para 2023, quando a dívida da construção da usina estará paga. Os trechos que tratam da comercialização de energia poderão ser alterados, o que gera expectativas no Paraguai. O país vizinho há tempos afirma que o Brasil paga pouco pela energia que os paraguaios não consomem e reivindica o direito de vendê-la para terceiros países ou no mercado livre (diretamente ao consumidor), o que hoje lhe é vetado.