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Por Redação O Sul | 11 de agosto de 2020
A vacina Gam-COVID-Vac Lyo, feita pelo Instituto de Pesquisa Gamaleya, de Moscou, é a aposta do governo russo para chegar na frente na corrida por um imunizante contra a Covid-19. Nesta terça-feira (11), o governo do Paraná afirmou que deve fechar acordo para trazer o imunizante ao Brasil.
O produto consiste de um “vetor viral não replicante”. Ele é essencialmente feito de RNA, material genético do vírus, capaz de produzir “antígenos”, moléculas similares ao novo coronavírus para “treinar” o sistema imune da pessoa a atacar o patógeno no caso de uma infecção real.
No caso, o RNA da vacina é transportado para dentro do organismo dos voluntários por meio de um outro vírus, um adenovírus inócuo, que não é capaz de se reproduzir (“não replicante”).
O teste da vacina russa foi registrado no portal ClinicalTrials.gov, dos NIH (Institutos Nacionais de Saúde dos EUA), que a OMS está usando como referência no compartilhamento de informações sobre os imunizantes em desenvolvimento. Não há nenhuma linha compartilhada com o público, ainda, sobre resultados dos testes.
Os russos afirmam que realizariam o teste de fase 1, para avaliar a segurança do produto, com aplicação por injeção intramuscular em 18 voluntários. Cinco dias após anunciar a fase 1, já começou a correr em paralelo um teste de fase 2 (para avaliar resposta imune), em 20 voluntários.
Nenhum resultado foi tornado público ainda, o que compromete tentativas de registro em quaisquer outros países que não a própria Rússia.
Ao depositar o registro em 18 de junho, o Gamaleya previa a data de conclusão dos testes para 15 de agosto. O objetivo da fase 2 do estudo era o de verificar se voluntários submetidos à vacinação estariam produzindo anticorpos contra a proteína “S”, ou “espícula”, do vírus, aquela que o SARS-CoV-2 usa para “agarrar” células humanas e invadi-las. Assim como a maior parte das outras vacinas sendo desenvolvidas, a esperança é que a presença da espícula por si só desencadeie uma resposta imune.
Além de avaliar segurança e imunogenicidade por anticorpos, os pesquisadores russos prometeram avaliar a qualidade da vacina de gerar anticorpos em grande quantidade e e de gerar resposta imune do tipo celular, na qual linfócitos atacam células infectadas, além de o anticorpo atacar o vírus em si. Sem um estudo publicado até hoje com os resultados dos testes, porém, ainda não é possível saber em quais desses objetivos a vacina russa foi bem sucedida.
Questão de fases
Para provar a eficácia da vacina de forma definitiva, de qualquer forma, a Gam-COVID-Vac Lyo precisa passar pelo crivo da fase 3, que avalia a eficácia, mostrando se a vacina protege os indivíduos, e qual porcentagem deles. O governo russo diz ter decidido pelo registro antecipado da vacina em função de resultados preliminares de eficácia obtidos ainda na fase 2. A fase 3 já estaria em estágio avançado de realização, segundo o governo russo.
A Gam-COVID-Vac é uma das 28 vacinas desenvolvidas no mundo que já estão em fase de testes clínicos, com voluntários humanos recebendo o produto. Outras 139 vacinas estão em estágio pré-clínico. Ela é uma das duas vacinas que já foram “aprovadas” localmente, mesmo antes de passar por fase 3. A outra é a vacina da Cansino, liberada na China para uso exclusivo pelas forças armadas do país.
O teste clínico de fases 1 e 2 da vacina russa, tal qual descrito pelo ClinicalTrials.gov, tem outra fragilidade em relação a vacinas concorrentes. Nesta etapa, os pesquisadores não tornara o estudo “randomizado”, ou seja, se permitiram escolher quem seriam os voluntários a receber a vacina e quais receberiam placebo, para efeito de comparação. Além disso, o estudo é “open label”, ou seja, médicos e voluntários sabem quando estão recebendo placebo ou vacina. O resultado de estudos feitos dessa maneira, porém, são mais vulneráveis a análises enviesadas, e considerados menos robustos pela comunidade científica.
Concorrentes da vacina russa, como a vacina chinesa da Sinovac, a ser testada no Brasil, realizaram estudos de fase 2 “randomizados” e “duplo-cegos” para afastar suspeitas de viés inadequado na pesquisa.