Nos Estados Unidos, beber leite se tornou motivo para bullying, principalmente nas redes sociais. O fenômeno é conhecido como “milk shaming” e tem motivado campanhas da pecuária leiteira do país para defender a bebida.
O TikTok é uma das ferramentas usadas para caçoar de quem toma leite, mas também é onde muitas pessoas têm recorrido para defender a bebida.
“Não consigo ter paz ou uma boa noite de sono só porque eu bebo leite da teta de uma vaca. E, porque você bebe [leite] de aveia, de caju, de soja, você acha que é melhor que eu? Isso está indo muito longe. Esse movimento tem que parar”, desabafa um consumidor.
Em outro vídeo, uma usuária pede desculpas a quem já tirou sarro por beber leite e afirma que também passou a gostar. No entanto, recebe diversos comentários negativos:
“Ok, mas leite de vaca ainda é ruim para o meio ambiente e causa as mudanças climáticas”, diz um deles.
“Tão fofo que você ama o sabor de leite de vacas estupradas, que é destinado aos seus filhos assassinados”, afirma outro comentário.
Origem do movimento
Mas esse movimento não surgiu do nada. Para a pesquisadora da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Gado de Leite e membro da International Milk Promotion Kennya Siqueira, essa mentalidade foi gerada por um marketing agressivo contra o setor lácteo nos Estados Unidos, feito, inclusive, por empresas que comercializam leite vegetal.
O movimento tem três argumentos principais contra o consumo da bebida: seu impacto no meio ambiente, os maus tratos aos animais na produção em massa, e a dificuldade do corpo humano adulto em ingerir leite.
Conforme Renata Potenza, pesquisadora do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), o efeito estufa é reforçado principalmente pela criação de gado para a produção de carne. A pecuária é responsável por pelo menos 12% das emissões de gás da atividade humana, segundo o relatório das Nações Unidas publicado em dezembro do ano passado sobre 2015.
Dentro da pecuária, o gado bovino é o maior emissor de metano e dióxido de carbono (67%). A produção de leite vem em seguida, com 30% dessas emissões. No caso do Brasil, a pecuária bovina provoca oito vezes mais gases do que a indústria do leite, revela o Observatório do Clima através do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), uma iniciativa do Observatório do Clima.
Sobre o tratamento dos animais, Kennya Siqueira informa que, atualmente, a maior parte dos produtores valoriza o bem-estar do animal porque isso melhora a qualidade do leite produzido. O Brasil já legisla em torno da proteção animal desde 1934. O Decreto nº 24.645, por exemplo, proíbe que os bichos realizem trabalhos excessivos.
Finalmente, em relação ao corpo humano, a intolerância ao leite pode acontecer por uma série de fatores: qualidade da bebida, genética, predisposição bioquímica, entre outros. Isso não significa que todos os adultos devem evitar a bebida. O líquido é bem nutritivo, porque, quando produzido adequadamente, carrega proteína, cálcio, vitaminas e minerais.
Geração Z
A rejeição ao leite está ligada com movimento sociais e culturais. Para Siqueira, o “milk shaming” está relacionado com um conflito geracional maior. Os maiores defensores de alternativas ao leite são a geração Y e Z em decorrência do seu compromisso com a causa ambiental. “À medida que essa informação de que o leite é ruim para o meio ambiente foi disseminada, eles compraram muito essa ideia”, explica.
Em uma tentativa de reverter a má reputação do leite, o setor leiteiro estadunidense tem investido em campanhas de conscientização sobre a bebida. É o caso da “OK2Milk”, divulgada em diversas plataformas e estrelada pela artista, atriz e comediante Queen Latifah. Apoiado pelo Departamento de Agricultura dos EUA, o conteúdo traz formas de refutar pessoas que condenam consumidores de leite, além de informações nutricionais.