Ao anunciar a ofensiva protecionista nas ordens executivas que impõem tarifas para México, Canadá e China, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, justificou a adoção de tarifas como resposta ao tráfico de drogas, como o fentanil, e à imigração ilegal.
Especialistas, porém, avaliam que o argumento do anestésico que se converteu em problema social é pretexto para atacar as preocupações da Casa Branca: o déficit comercial com parceiros e a imigração ilegal, tema que sempre fez parte da agenda de Trump.
Para Gary Hufbauer, especialista do Peterson Institute for International Economics, estas são as prioridades de Trump, o que confere ao Brasil alívio temporário. Embora alumínio e aço sejam dois itens visados, Hufbauer cita que os EUA têm superávit no comércio com o Brasil, o que faria com que ficasse ao largo, ao menos inicialmente, da sanha por tarifas:
— O Brasil não seria uma preocupação para Trump. Provavelmente não seria afetado no curto prazo.
No ano passado, o Brasil teve pequeno déficit comercial de US$ 253 milhões nas transações com os EUA. Para efeito de comparação, segundo dados do Escritório do Censo dos EUA, o déficit comercial com o Canadá somou quase US$ 55 bilhões.
Para Hufbauer, o caminho adotado, porém, não resolverá o problema, e apenas deslocará o déficit para transações com outros países.
Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central, vê o país “lá embaixo” na lista de prioridades dos EUA em tarifação, diante de uma corrente de comércio pequena em relação a outras economias. Mas ainda assim a economia brasileira pode “sofrer por tabela”.
Diplomacia em alerta
As ações de Trump deixaram o governo brasileiro em alerta. Nos bastidores, integrantes da diplomacia dizem que haverá retaliação, caso o Brasil seja alvo de tarifas, como o presidente Lula disse na semana passada.
A forma como isso pode ser feito ainda está sendo avaliada, já que não se sabe quais setores seriam afetados nem a intensidade. E lembram que, em 2018, Trump chegou a disparar críticas contra tarifas praticadas pelo Brasil, mas não levou adiante a ameaça. A pauta de produtos comprados dos EUA abrange insumos para indústria, matérias-primas, medicamentos, maquinário e outros. Ao sobretaxar os itens, o Brasil elevaria o custo de produtos, onerando o setor privado e pressionando a inflação.
Agressão comercial
Como faz parte do Mercosul e adota a Tarifa Externa Comum, uma taxa de importação unificada para o bloco, o Brasil tem limitações para sobretaxar unilateralmente outro país. Uma das formas é via “Letec”, lista de exceções da tarifa do Mercosul.
Ela já vigora e depende apenas de decisão do governo, mas só pode contemplar cem produtos. Ela é limitada a 35%, teto definido pela Organização Mundial do Comércio (OMC). Na leitura do governo, isso não seria empecilho, e o Brasil não precisaria de autorização da OMC.
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— No Brasil, se faz toda matéria de alteração em tarifas, em relação ao Mercosul, e isso não vai ao Congresso. Mas a palavra final é da Fazenda e do MDIC (Ministério de Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços) — afirma José Alfredo Graça Lima, diplomata de carreira e vice-presidente do conselho curador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri).
Ele pondera que o processo de questionamento de tarifas na OMC pode durar até dois anos através de painel:
— E, quando há conclusão, o relatório pode ser submetido à apelação de recurso. E isso pode não acontecer porque não tem órgão para julgar esse recurso — afirma Graça Lima, em referência ao comitê de especialistas que estuda as queixas apresentadas à OMC.
— Não acho boa ideia (retaliar), mas os políticos se veem obrigados a reagir de uma agressão de natureza comercial. As informações são do portal O Globo.