O maior estudo genético já feito sobre esquizofrenia identificou mutações extremamente raras em 10 genes que podem aumentar em mais de 20 vezes o risco de um indivíduo desenvolver a doença. Um segundo estudo, incluindo alguns dos mesmos pesquisadores, elevou para 287 o número de regiões do genoma associadas ao risco de esquizofrenia. As descobertas abrem caminho para o desenvolvimento de novos tratamentos. Ambos os estudos foram publicados na revista Nature.
“Ao sequenciar o DNA de milhares de pessoas, estamos começando a ver exatamente quais genes são importantes. Essas descobertas são o ponto de partida para o desenvolvimento de novas terapias que tratam a causa raiz dessa condição devastadora”, disse Benjamin Neale, co-autor do primeiro estudo e co-diretor do Programa de Genética Médica e Populacional do Instituto Broad, do MIT.
As descobertas são fruto de um esforço de uma década liderado por pesquisadores do Stanley Center e quase quatro dúzias de outras instituições em todo o mundo. Ambos os projetos visam coletar e comparar DNA de um grande número de pessoas com e sem esquizofrenia.
No primeiro trabalho, pesquisadores do SCHEMA, um consórcio internacional liderado pelo MIT e por Harvard, nos Estados Unidos, sequenciaram exomas inteiros de 24.248 pessoas com esquizofrenia e 97.322 sem a doença na busca por variantes que eliminassem ou alterassem a capacidade de um gene produzir proteínas funcionais. O exoma corresponde à uma pequena parte do genoma, cerca de 2%, que codifica proteínas.
A equipe identificou variantes ultra-raras em 10 genes que aumentaram drasticamente o risco de uma pessoa desenvolver esquizofrenia.
“Em geral, qualquer pessoa tem cerca de 1% de chance de desenvolver esquizofrenia em sua vida. Mas se você tiver uma dessas mutações, isso se torna uma chance de 10%, 20% e até 50%”, disse Neale.
Suas descobertas também sugerem 22 genes adicionais que provavelmente também influenciam o risco de esquizofrenia, e que podem ser significativos após um estudo mais aprofundado. Juntos, esses genes apontam para a disfunção na sinapse – a comunicação entre os neurônios – como uma possível causa da esquizofrenia.
Separadamente, uma equipe do Consórcio de Genômica Psiquiátrica (PGC) examinou variações genéticas comuns em 76.755 pessoas com esquizofrenia e 243.649 sem a doença. Eles encontram 287 regiões do genoma com algum envolvimento no risco de esquizofrenia. São 94 regiões a mais do que a última análise do grupo, divulgada em 2019. Uma análise mais aprofundada revelou 120 genes que potencialmente aumentam o risco da doença.
“A complexidade biológica da esquizofrenia é realmente assustadora, mas essa combinação de variantes raras de alteração de proteínas do sequenciamento do exoma e variantes comuns nos colocou no caminho para entender as raízes dessa complexidade. Nesses resultados, podemos vero como as anormalidades ou perdas sinápticas começam na esquizofrenia, dando-nos aberturas para diagnosticar e tratar as pessoas muito mais cedo do que podemos hoje”, disse Steven Hyman, membro do Broad Core Institute e diretor do Stanley Center.
Os dados do também lançam luz sobre como os distúrbios psiquiátricos e do neurodesenvolvimento podem compartilhar de forma mais ampla o risco genético. Por exemplo, vários genes envolvidos no risco de esquizofrenia já foram associados a outras condições do neurodesenvolvimento, como epilepsia, atraso no desenvolvimento e deficiência intelectual. Entretanto, os outros distúrbios, foram impulsionadas por diferentes tipos de mutações.
Juntos, esses estudos ressaltam uma visão da esquizofrenia como uma falha na comunicação na sinapse (a junção entre os neurônios) e ilustram como diferentes tipos de variação genética que afetam os mesmos genes podem influenciar o risco de diferentes distúrbios psiquiátricos e de desenvolvimento neurológico.
“Com a esquizofrenia, como com outros distúrbios complexos, acho que acabaremos descobrindo que muitos processos estão envolvidos em risco ou proteção”, acrescentou Mark Daly, autor co-correspondente do SCHEMA e colaborador do PGC, que também é membro do instituto no Stanley Center.
Compreender as raízes dessas doenças é fundamental para entender seus sintomas, além de poder realizar um diangóstico precoce, preciso e desenvolver novos tratamentos. Entretanto, Hyman, ressalta que ainda levará anos para “traduzir esses resultados em biomarcadores e tratamentos que farão a diferença na vida das pessoas que sofrem com essa doença devastadora”.
“Mas é altamente motivador ter um caminho convincente”, disse.