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Está na hora de ser selvagem

(Foto: Reprodução)

Comecei a ler o clássico “Mulheres que correm com os lobos”. Aliás, recomecei. É um livro difícil, denso. Mas ele caiu novamente na minha mão, e eu acredito muito nisso: as coisas vêm pra nós no tempo certo.

Pois calhou que, após uma discussão com o marido (quem nunca?), fui me refugiar no meu canto preferido da casa: uma poltrona preta junto à minha parede de obras de arte e com vista para as luzes noturnas, ao lado da qual repousam todos os livros que leio ao mesmo tempo. Mas esse não. Esse estava esperando para ser aberto.

Li apenas o começo e já foi o suficiente para me abrir a mente. O conceito de “mulher selvagem” nos atropela com uma intensidade arrebatadora. A ideia de que fomos domesticadas é de uma verdade dolorida. A mulher se adaptou a uma sociedade que lhe queria apenas para procriação e criação dos filhos. 

“Tá, Ali. Isso todo mundo já está careca de saber”. Bom, se não quiser assumir a cabeça sem cabelos, sempre existe a possibilidade de usar uma peruca – elas estão cada vez mais discretas! E quanto à situação da mulher nesse mundo, sim, todos sabemos da luta ainda em andamento por direitos iguais, reconhecimento e equidade. Isso é notório. O que surpreende é o fato de nos darmos conta de que nem sempre foi assim. 

Se olharmos para trás lembraremos do papel importante que feiticeiras possuíam na sociedade celta, por exemplo. Também nos povos nórdicos se via uma mulher com poder equiparado – e falo de poder sobre si mesma e sobre seu corpo, inclusive com a opção de poder escolher com quem se relacionar (não por acaso, essa cultura impacta, até hoje, nas relações de maternidade e paternidade dos países escandinavos). Rainhas que efetivamente governavam e elevavam à potência máxima suas habilidades femininas: Cleópatra é, possivelmente, o caso mais emblemático. 

O óbvio precisa ser dito: a sociedade clássica greco-romana e a forte influência religiosa deixaram a mulher como coadjuvante por séculos. E, no processo, a botou em uma “caixa”  para fora da qual vem sendo uma jornada trabalhosa sair.

Mas o DNA é algo incrível, e lá nos nossos códigos genéticos subsistem resquícios dessa nossa feminilidade selvagem. Esse poder vital que nos permite gerar um ser humano e lutar com todas as forças por ele. Sim, porque eu não conheço espécie mais forte que a mãe, seja ela gata, leoa ou humana. E para ser mãe, é preciso ser mulher de corpo, alma e mente. Porque aí reside a essência da vida. Da natureza. Nós somos parte dela. Parte indissociável. Nós somos natureza, afinal (com belas pinceladas de cultura, é verdade).

Essa verdade está enraizada em nossas células, ancestralmente, e, por isso, não devemos temer tal força. Pelo contrário, é hora de enaltece-la e deixar essa versão forte, selvagem, natural mais à vontade. 

Não, caro leitor. Eu não pretendo sair pela madrugada uivando para a lua, fique tranquilo. Mas não se espante se eu começar a estimular as mulheres a resgatarem a força da loba que existe dentro de cada uma de nós.

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