A escalada autoritária de Nicolás Maduro virou uma dor de cabeça para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que chegou a se aproximar do ditador, mas se afastou dele nos últimos meses. “A estratégia para a Venezuela foi equivocada desde o início”, afirma Hussein Kalout, pesquisador da Universidade Harvard. “O Brasil acreditou que poderia moderar Maduro. Mas Maduro usou o Brasil e expôs o País a uma situação delicada.”
Para analistas, a estratégia usada pelo Brasil para lidar com a ditadura da Venezuela, que misturou reabilitação política e apoio para a realização de eleições, foi errada e repleta de contradições.
Alvo de ataques do antigo aliado, Lula deu sinais de irritação com Maduro, vetou a entrada da Venezuela no Brics e não compareceu à posse. O Brasil foi representado pela embaixadora em Caracas Glivânia Oliveira. “O gesto de enviar representante é um reconhecimento do regime. É uma contradição”, disse a analista venezuelana María Puerta Riera.”
Mesmo sem reconhecer a vitória de Maduro, o Brasil evita a ruptura e hesita em subir o tom contra o chavismo. “Lula ficou numa situação delicada”, disse Regiane Bressan, professora de relações internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Existe uma pressão para condenar a Venezuela justamente pela defesa da democracia que Lula faz.”
Professor de Relações Internacionais, pesquisador da Universidade de Harvard e ex-secretário especial de assuntos estratégicos do Brasil, Hussein Kalout pondera, contudo, que o governo deve manter as relações diplomáticas. O Brasil compartilha mais de 2 mil quilômetros de fronteira com a Venezuela e recebeu mais de um milhão de imigrantes, embora quase metade já tenha deixado o País. Além disso, assumiu a embaixada argentina em Caracas, onde cinco opositores venezuelanos permanecem asilados, sob cerco constante do regime.
“A ruptura não é uma opção interessante para o Brasil do ponto de vista estratégico”, afirmou Kalout. “Isso não quer dizer que há de haver concordância com a continuidade de Maduro no governo. Obviamente, existem várias formas de protestar”.
Trump
De volta à Casa Branca, Donald Trump é quem pode fazer a diferença com o aperto das sanções. O cerco, porém, pode provocar um êxodo ainda maior de venezuelanos em direção aos EUA – e o controle da imigração é uma das bandeiras de Trump, que vai precisar da colaboração de Maduro se quiser colocar em prática seus planos de deportação em massa.
Executivos do setor petrolífero pedem que Trump abandone a pressão sobre a Venezuela e defendem um acordo com Maduro para reduzir a imigração, segurar o preço dos combustíveis e conter a influência de China e Rússia. Mas, apesar do lobby, poucos acreditam que as sanções serão aliviadas. Pelo menos no discurso.
“O que Trump pode fazer é aplicar sanções e costurar o isolamento total da Venezuela no Ocidente, mas isso em certo sentido já está acontecendo”, afirma Hussein Kalout. “Agora, se precisar de petróleo venezuelano ele pode discursar numa direção e manter um nível de sanções que não atinja os interesses dos Estados Unidos naquilo que diz respeito à importação de petróleo venezuelano barato”. (Estadão Conteúdo)