Pesquisadores da University College London (UCL) e da Brighton and Sussex Medical School atestaram recentemente que a depressão e a perda de memória em pessoas com mais de 50 anos estão diretamente relacionadas. Publicado na revista científica Jama Network Open, o estudo que analisou dados de 8.268 pessoas com idade média de 64 anos na Inglaterra não conseguiu esclarecer, no entanto, qual delas surge primeiro.
“Nosso estudo mostra que a relação entre depressão e falta de memória ocorre em ambos os sentidos, com os sintomas depressivos precedendo o declínio da memória e o declínio da memória ligado a sintomas depressivos subsequentes”, declarou em nota a autora sênior da pesquisa, Dorina Cadar, do Departamento de Ciência Comportamental e Saúde da UCL e da Brighton and Sussex Medical School.
Segundo ela, os dados também sugerem que intervenções para reduzir os sintomas depressivos podem ajudar a retardar o declínio da memória. Médica especializada em oncogeriatria, Maria Laura Lazaretti Perini explica a via de mão dupla.
Segundo a médica, melhorando o humor do paciente, a queixa cognitiva, muitas vezes, também será resolvida. Porém, se a depressão não for tratada, a longo prazo, pode evoluir até para uma demência. Ela faz questão de ressaltar, porém, que nem todo esquecimento é resultado dessa síndrome clínica.
Nem mesmo a perda da funcionalidade, que é quando a pessoa não consegue mais realizar tarefas que antes fazia com facilidade, somada a uma pontuação baixa em testes cognitivos, é capaz de denunciar a síndrome. Não sem uma avaliação mais ampla. “Antes, é preciso afastar uma série de doenças que causam esquecimento”, explica.
As alterações de humor interferem em toda a parte cognitiva. Um paciente com depressão terá a memória de curto prazo prejudicada. Vai se esquecer do que precisa fazer, ficar mais lento, ter dificuldade de concentração, piora na qualidade do sono”, contextualiza.
A lista é extensa. Comprometimento hepático, alteração na função tireoidiana normal, mal funcionamento dos rins, HIV e comprometimento em alguma parte do crânio são algumas das comorbidades que podem apresentar perda de memória como consequência.
Sem poder lidar
A outra mão dessa via é quando um paciente recebe o diagnóstico de demência e, mesmo com as funcionalidades perfeitamente em dia, desenvolve um quadro depressivo porque prevê o rumo que sua saúde vai tomar (leia-se a perda de autonomia e de funcionalidade) e não consegue lidar com a situação.
Ou ainda quando a síndrome está em situação avançada, e a pessoa naturalmente fica prostrada, apática.
Alinhadas com o resultado do estudo, as observações da geriatra vão ao encontro das declarações do autor principal, Jiamin Yin, doutorando na Universidade de Rochester, em Nova York.
“Essas descobertas ressaltam a importância de monitorar mudanças de memória em adultos mais velhos com sintomas depressivos crescentes para identificar precocemente a perda de memória e prevenir agravamento adicional da função depressiva”, disse, na divulgação da análise.
“Por outro lado, também é fundamental abordar os sintomas depressivos entre aqueles com declínio de memória para protegê-los do desenvolvimento de depressão e disfunção de memória”, completou.
Jiamin e sua equipe, no entanto, deixaram claro que o estudo que realizaram é observacional e que, portanto, não foi possível estabelecer causalidade. De acordo com sua explicação, fatores como a prática de atividade física e doenças ligadas à qualidade de vida podem ter afetado os resultados.
A importância de fazer exercícios, principalmente entre o público com mais de 50 anos, é outra tecla na qual Maria Laura não se cansa de bater. “A atividade física melhora sintomas de depressão, melhora sintomas de ansiedade, mas também tem impacto na queixa cognitiva”, afirma a médica.
Buscar ajuda médica e psicoterapia aos primeiros sinais da doença também é fundamental. “A depressão não tratada impacta toda a família”, finaliza Maria Laura.