Segundo alguns estudos, há um componente genético por trás da vontade de algumas pessoas de viajar – é a síndrome PPP – Permanent Passport in Pocket (síndrome Passaporte Permanente no Bolso). Uma série de artigos revelaram a presença de um gene da «sede de viagens» (wanderlust) – o DRD4-7R, mais precisamente.
Um blog de psicologia sugeriu que o 7R, uma variação do gene DRD4 – que atua nos níveis de dopamina no cérebro e acaba por resultar em motivação e comportamento – existe em 20% da população humana. A variante 7R, segundo os pesquisadores, traduz-se em “inquietação e curiosidade”. Essa inquietação pode impulsionar as pessoas a assumirem riscos maiores, que incluem explorar novos lugares.
A dopamina funciona no cérebro como se estivesse a gritar: “Novo! Mais! Novidade!”. Dawn Maslar, uma bióloga da Universidade de Kaplan, nos Estados Unidos, estudou o efeito que hormonas como a dopamina podem ter no cérebro. Dawn acredita que há uma relação direta entre este gene e o número de carimbos no passaporte de alguém. “A dopamina é o gene do gostar, e quando se quer mais, não se fica saciado – acaba-se viciado”, disse à revista Condé Nast Traveller. “Vemos uma percentagem maior do gene DRD4-7R em sul e norte-americanos, pelo menos naqueles que são descendentes de europeus”. A palavra wanderlust, claro, é um empréstimo da palavra alemã wanderlust, que significa “paixão por viagens”.
Todd Bliwise tinha nove anos quando tentou viajar pela primeira vez de avião. Apanhou um táxi sozinho em sua casa, em Palo Alto, na Califórnia, e quase conseguiu entrar num voo – não fosse um funcionário do aeroporto ter-lhe pedido o cartão de embarque. “Fui apanhado”, confessou. O empregado chamou de imediato a mãe de Todd, que correu para o terminal das partidas. “Não pensei em toda a logística, foi um impulso: queria ver coisas novas e experimentar o mundo”, afirmou Bliwise duas décadas depois. “Entrei no quarto dos meus pais, fui ao armário e peguei numa mala castanha do meu pai – daquelas dos anos 1980 – e enchi-a de coisas que achava serem necessárias: meias, roupa interior e um pacote de bolachas. Lembro-me de pegar nela e sentir que a minha missão tinha sido bem-sucedida.”
Com o passar dos anos, a vontade de Todd para viajar só se intensificou. Quando era adolescente não pedia sapatos ou cds novos, mas sim viagens e vouchers de hotel. Tal como muitos outros rapazes de 15 anos, conseguiu um cartão de identidade falso – mas no seu caso não era para entrar num bar, e sim para poder fazer sozinho o check-in num hotel. “Lembro-me da primeira vez que mostrei o meu bilhete de identidade. Foi num hotel em Nova Iorque, perto de Times Square”, disse Todd Bliwise. “Estava nervoso, mas aquele momento foi o princípio do resto da minha vida.” Quando fez 18 anos, tinha já estado em hotéis de 48 estados norte-americanos. E que carreira acabou por seguir? Agente de viagens internacionais. “Ainda hoje adoro o caminho até ao aeroporto. É tão emocionante”, avalia.
Como muitas outras pessoas, Bliwise não se lembra de um único momento em que viajar não fosse o mais importante para sua vida e para sua personalidade. Mas podemos mesmo nascer wanderlusters (com sede de viajar)? Tal como ele, há tantas outras pessoas com esta vontade de sair e conhecer novos lugares e pessoas. Aliás, muitas delas nem casa têm.
Ao contrário dos estudos que apresentam a teoria do gene DRD4-7R, Cynthia Thomson, investigadora no Hospital Richmond, em Vancouver, e especializada na ciência da procura de emoção, é mais cautelosa a tirar conclusões. A decisão racional de correr riscos encontra-se na genética humana desde a era dos caçadores-recoletores, quando os mais ousados em explorar novos territórios e fontes de alimento tinham mais probabilidades de sobreviver. Mas não se pode atribuir este impulso apenas ao ADN. “A personalidade é poligénica, isto é, uma tonelada de genes contribui para formá-la, e é difícil separar do meio ambiente, os elementos químicos presentes no nosso cérebro”.
Há também quem pense que esta vontade é contagiante em vez de ser inata. Gloria McCoy, diretora do Traveller’s Century Club – organização que representa viajantes que já tenham ido a mais de 100 países – considera que a “sede de viajar” vem das relações pessoais a que uma pessoa está exposta. “Definitivamente ganhei a vontade de viajar do meu marido, quando o conheci há 29 anos – ele é um verdadeiro viajante”, afirmou.
Quaisquer que sejam as origens deste impulso wanderlust – sejam genes presentes no ADN ou uma tendência psicológica desencadeada por certas condições –, há uma verdade que parece incontestável: a melhor maneira de tratar esta vontade louca de viajar é render-se a ela.