Em apenas três meses, cerca de 2 mil vagas de medicina pleiteadas judicialmente foram autorizadas pelo Ministério da Educação (MEC) e esse número será ainda maior. Isso porque há outros 110 processos em análise e várias faculdades que tiveram seu pedido de abertura de curso, feito via liminar e indeferido pela pasta, agora estão entrando novamente na Justiça.
Nesse cenário de ampla oferta, segundo fontes, há instituições de ensino de pequeno porte do interior que obtiveram liminar e agora estão vendendo no mercado essas vagas de medicina judicializadas por R$ 600 mil, cada – um valor 70% inferior ao praticado há dois anos – com negociações realizadas por meio de escritórios de advocacia e até corretor de imóveis.
“O MEC vem tentando restabelecer a legitimidade do Mais Médicos e a
responsabilização pelas aprovações dos cursos de medicina, com base no que foi decidido pelo STF”, disse Rodolfo Cabral, consultor jurídico do Ministério da Educação.
No total, há 186 processos judiciais pleiteando cursos de medicina fora do Programa Mais Médicos, que é o caminho oficial para operar essa graduação no Brasil desde 2013. Essas liminares somadas equivalem a cerca de 35 mil vagas – para efeitos de comparação, o setor privado todo detinha 37,8 mil vagas em 2022 (dado mais recente).
Desse volume, o MEC analisou, nos últimos três meses, 75 processos, sendo que 35 (2 mil vagas) foram aprovadas e 34 (8,7 mil) negadas. (veja arte). Há essa desproporção porque o governo só autoriza a criação de 60 vagas para cada pleito, mas muitas escolas solicitaram mais de 100.
O incremento dessa graduação no mercado ainda é incerto. Além do grande volume de processos, nos últimos dias, grupos educacionais entraram na Justiça para reverter decisões do MEC que havia negado os pedidos de abertura de cursos da em Belo Horizonte e no Rio de Janeiro, e da Unis, em Varginha (MG).
Os juízes que acataram as demandas dessas duas instituições de ensino derrubaram as regras do MEC. Por essa legislação, graduações de medicina só podem ser abertas em cidades que tenham menos de 3,75 médicos por mil habitantes e com infraestrutura na rede pública de saúde para os alunos realizarem aulas práticas.
“Caso essas decisões avancem, nossa expectativa é que cerca de 75% das vagas sejam aprovadas. Hoje, está em torno de 50%”, disse Paulo Chanan, presidente da Associação Brasileira das Faculdades (Abrafi).
Segundo fontes, essa nova onda de venda de vagas ocorre porque muitos daqueles que entraram na Justiça, há cerca de dois anos, já tinham intenção de lucrar com liminares e não operar uma faculdade nessa área.
Aqueles que já obtiveram o credenciamento do MEC estão negociando, cada vaga de medicina, por cerca de R$ 1 milhão. Já entre aqueles que estão apenas com a liminar, há ofertas de cerca de R$ 600 mil – essa diferença de preço ocorre porque ainda há risco de indeferimento. Há dois anos, uma vaga era avaliada em R$ 2 milhões.
Em junho, a adquiriu uma faculdade em Curitiba, cuja graduação de medicina foi aberta por meio de uma liminar e, posteriormente, obteve autorização. O
Centro de Ensino em Pinhais conseguiu credenciamento da pasta em 2022 e já havia realizado dois processos seletivos. A Cruzeiro pagou R$ 1,2 milhão, por vaga – o menor preço já fechado no setor.
“O processo de aprovação de vagas com liminares está acelerado, num ritmo bem acima do que estávamos prevendo, o que vai impactar o setor mais rapidamente”, disse Leandro Bastos, analista do Citi.
“O número de vagas aprovadas tende a ser maior do que as estimativas iniciais do setor que eram de 3 mil a 4 mil. O preço e ocupação podem se deteriorar mais rapidamente”, segundo Maurício Cepeda e Lucas Nagano, analistas do Morgan Stanley, em relatório.
O MEC começou a analisar os pedidos judiciais para abertura de curso de medicina em junho, logo após o Supremo Tribunal Federal (STF) determinar que os processos que estavam em fase adiantada de análise dentro da pasta poderiam seguir os trâmites. De um total de 365 liminares encaminhadas ao MEC, 186 se enquadraram à regra determinada pelo STF.
A pasta passou a adotar os mesmos critérios de elegibilidade usados no Mais Médicos, que é o caminho legalizado para operar essa graduação no país. O programa prioriza cidades do interior – o que desagradou a turma das liminares que pede abertura em grandes cidades. Eles argumentam que esses critérios foram implementados após o ingresso das liminares.
A Ser informou que seus cursos de medicina pleiteados para as cidades do Rio de Janeiro e Belo Horizonte foram solicitados em 2022, por meios de processos administrativos, e que obtiveram conceitos 5 e 4, respectivamente (de um ranking entre 1 a 5). E, que em julho de 2024, esses processos foram indeferidos com base em “fundamentos que são objetos de questionamentos judiciais e administrativos.”