Estimulado pelo produtor Robertinho de Recife, Fagner já tinha um projeto de gravar um disco voltado às músicas feitas com Belchior. Era uma ideia que todos sabiam ser poderosa, cruzando dois dos cearenses mais voluptuosos da MPB. “Eles mostraram que o Nordeste não acaba na Bahia”, dizia Ronaldo Bôscoli. De fato, ao contrário de baianos, mineiros, paulistas ou pernambucanos, nenhuma geração de cearenses anterior ou posterior a eles fez o mesmo pelo Ceará. Mas veio a pandemia, outros trabalhos se sobrepuseram e Fagner, de 73 anos, levou o encontro póstumo com Belchior em banho-maria, até que o destino, ou um golpe de baioneta do passado, reacendesse suas vontades.
Ao passar por outros motivos pelo site do Sian, o Sistema de Informação do Arquivo Nacional, um depositário valioso, o jornalista e pesquisador Renato Vieira se deparou com duas letras assinadas por Fagner e Belchior. Ao serem encaminhadas para a análise da censura, as músicas Alazão, de Fagner, Belchior e Fausto Nilo, e Posto em Sossego, de Fagner e Belchior, feitas entre 1971 e 1972, não tiveram problema algum com os censores e foram liberadas, mas não chegaram a ser gravadas. Vieira farejou, confirmou e colheu o material. A descoberta virou notícia e Marcelo Fróes, produtor, fez com que as letras chegassem a Fagner.
Um bolero
“Foram as duas músicas que fizeram com que seguíssemos em frente com a ideia”, diz Fagner. O disco ganhou o nome de Meu Parceiro Belchior, cheio de histórias em cada canção. Elis Regina lançou duas delas: Mucuripe e Noves Fora. A Palo Seco traz a voz reaproveitada do próprio Belchior, cantando em um disco de Fagner pela primeira vez.
Outra faixa, Bolero em Português, cantada por Amelinha, foi a última canção feita pelos dois amigos antes do afastamento e se tratou de uma homenagem a Angela Maria. “Estávamos vivendo juntos em uma quitinete na Rua Barata Ribeiro, no Rio, com cinco pessoas dormindo em duas camas. Fazer bolero não era com a gente, mas imaginei Angela Maria e fiz para ela. Não sei por que ela não gravou.”
Frejat canta Contramão não por acaso. Cazuza passa pela história de Fagner primeiro como divulgador de gravadora. Foi sua primeira profissão, antes de assumir-se como cantor de rock. “Ele divulgou meu álbum, Ave Noturna, e, depois, gravou Contramão comigo (lançada em 1985). É por isso que chamamos Frejat, tinha a ver com essa história.”
Xand Avião, empresário e ex-cantor do grupo de forró eletrônico Aviões do Forró, foi convidado para cantar Noves Fora, que já teve registros de Wilson Simonal e Emílio Santiago. Há ainda Galos, Noites e Quintais, de 1976, com Robertinho de Recife nas cordas, e Moto 1, de 1973. Paralelas, de 1975, e Mucuripe, foram captadas de registro ao vivo.