Depois de um carro da Ferrari todo em ouro e de um jatinho de US$ 50 milhões, bens falsamente atribuídos a um dos filhos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a família do líder petista foi relacionada a mais um patrimônio, desta vez bilionário. E novamente tudo não passa de boato. O assunto circula no WhatsApp ligando “Lulinha” a uma fazenda de R$ 4 bilhões em Goiás, com direito a fotos da área.
O corretor responsável pela venda da propriedade, no entanto, informou que não há relação com a família do ex-presidente. Usando a ferramenta de pesquisa reversa de imagens, é possível encontrar o anúncio de venda da fazenda de 135 mil hectares. A propriedade fica em São Miguel do Araguaia, próxima ao Estado de Tocantins. As imagens de satélite do Google da área batem com as fotos usadas no boato.
Por mensagem, o corretor responsável confirmou que a fazenda não é de Lulinha e que a propriedade já está em negociação. A corrente de WhatsApp mistura ainda imagens de satélite de uma segunda fazenda, em Valparaíso, no Estado de São Paulo. Essa propriedade também já foi falsamente atribuída ao filho de Lula, como informa uma reportagem da revista Dinheiro Rural de 2008.
Outras fotos que entraram no “pacote” do boato são as de uma visita de Lula e da ex-primeira dama Marisa Letícia a uma fazenda do empresário Jonas Barcellos. O boato já foi desmentido pelo jornal “O Estado de S. Paulo” e pelos sites Boatos.Org e E-Farsas.
Especialista
Quais ingredientes fazem um boato viralizar? Segundo a pesquisadora britânica Claire Wardle, diretora da organização First Draft, conspiração, medo, ódio, religião e apenas uma pitada de verdade são os elementos de uma receita que já foi testada em outros países e se repetiu neste ano nas eleições do Brasil.
Ela esteve em São Paulo nesta sexta-feira, 23, para celebrar o término dos trabalhos do Comprova, coalizão formada por 24 veículos de mídia para combater a desinformação em período eleitoral. Ao comparar a experiência de trabalhar nas eleições de outros países com a atividade no projeto brasileiro, a pesquisadora identificou vários pontos de semelhança na temática dos boatos que enganam eleitores.
Ainda segundo Claire, a desinformação on-line usa tópicos que se aproveitam das profundas mudanças sociais que ocorreram ao longo dos últimos anos. A crise financeira global, as tendências de imigração mundiais, o medo do impacto da automação sobre os empregos e o impacto da corrupção sobre a confiança dos eleitores contribuíram para uma sociedade mais dividida do que nunca.
Esse cenário resulta em um sentimento de incerteza entre as pessoas, que as torna mais vulneráveis a mensagens de alto conteúdo emocional. Como as histórias enganosas ou falsas que circulam on-line, por exemplo: “Estamos com medo, e isso nos torna mais ‘tribais’. As pessoas estão se conectando com quem tem as mesmas crenças. Vemos comunidades cada vez mais isoladas que se enxergam sob a lente do ‘nós contra eles’. Temos que reconhecer o poder da desinformação de colocar uns contra os outros”.
Apesar de se parecerem, na forma e no conteúdo, com os boatos que circularam em países como Estados Unidos e Índia, as mentiras brasileiras se beneficiaram do grande alcance do WhatsApp. O modelo de comunicação no aplicativo, que tem conversas privadas, se tornou um desafio para checadores que precisavam monitorar a desinformação que estava na plataforma.