A intenção do governo de igualar a idade mínima de aposentadoria para homens e mulheres está provocando debate entre feministas de diversos ramos acadêmicos. A maioria defende que se mantenha a diferença, pela dupla jornada feminina e pela baixa cobertura de creches e escolas em tempo integral.
Mas há quem defenda que a igualdade é bem-vinda, diante da vida sete anos mais longa da mulher e para não reforçar o papel tradicional feminino. Para se chegar à igualdade, no entanto, defendem que é necessário um tempo de transição.
A proposta do governo que está tramitando no Congresso prevê 65 anos de idade para se aposentar. Atualmente, as mulheres podem requerer o benefício a partir de 60 anos e os homens, 65 anos.
A economista e professora da UFF, estudiosa das questões de gênero, Hildete Pereira de Melo é categórica na sua defesa da aposentadoria mais cedo para as mulheres: “Nos países em que há igualdade, há também políticas compensatórias para as mulheres. Há que ter uma compensação para o trabalho reprodutivo.”
No Brasil, as creches, públicas e privadas, atendiam a 24,6% das crianças de 0 a 3 anos em 2014. Só 9% dos estudantes estão na escola em tempo integral.
A socióloga Clara Araújo, da UFRJ, defende a igualdade, mas está contra a reforma do jeito que está posta na mesa. Ela defende um período de transição, inclusive para os homens. “Dedicar mais tempo ao trabalho doméstico e interromper a carreira para atender à família prejudicam efetivamente a aposentadoria. Mas a forma de enfrentar o problema não é reforçando essa visão essencialmente paternalista e que estimula os papeis sexuais. A esta altura, no Século XXI, não há como defender essa diferença. E mundo caminha para igualdade.”
Em 14 países da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), que reúne 34 países desenvolvidos, a idade para se aposentar é a mesma para homens e mulheres.
A economista Lena Lavinas, professora da UFRJ e atualmente no Institute for Advanced Study de Berlim, é contra a mesma idade mínima. Diz que a reforma subverte os princípios da Previdência brasileira: “Nosso sistema é de repartição. Os jovens pagam para os idosos e os homens para as mulheres, já que elas trabalham mais e ganham menos. Há um efeito redistributivo na previdência. É a característica intrínseca do sistema de repartição. As mulheres não têm que pagar por mais tempo. O ideal é que mais mulheres contribuam. Se desincentivar a contribuição, todos sairão perdendo.”
Bila Sorj, socióloga e professora da UFRJ, defende a igualdade, com ressalvas, como um período de transição de dez anos. “Sou a favor da igualdade de gênero, portanto tem que ser consistente com modelo de previdência que proponha a igualdade na idade de aposentadoria. É importante a equalização da mulheres e homens. Como a mulher trabalha mais horas, o ideal é que fosse implantada ao longo de dez anos, para dar tempo que as políticas públicas para atenuar o trabalho reprodutivo fossem implantadas também, com aumentar a licença-paternidade para ter divisão melhor do trabalho doméstico e mais creches.”
O secretário da Previdência Social, Marcelo Caetano, reconhece que há desigualdades no mercado de trabalho, mas que “não vão se resolver por meio da aposentadoria”. “A Previdência não é a solução”, afirma.
O secretario esteve na Fundação Getulio Vargas em um debate sobre o tema e afirmou que o “governo vai se mais fiel possível à proposta enviada ao Congresso”.
Sobre a declaração de deputados de que não será possível aprovar a proposta até junho, o secretário disse que o “Congresso é soberano“. (AG)