Perto do final de Joy, disponível na Netflix, o choro abafado de um bebê recém-nascido leva um homem e uma mulher em um hospital a se abraçarem puramente por felicidade. Eles não são os pais, mas tiveram tanto a ver com o nascimento quanto os dois.
Esse filme encantador traça a história real de uma década sobre como o primeiro bebê de fertilização in vitro (FIV) do mundo nasceu na Inglaterra em 1978 – uma menina de 2,65 kg que abriu caminho para milhões de outros. É uma narrativa positiva e muito inglesa, mesclando discussões sóbrias sobre endometriose com biscoitos de chocolate.
O casal que se abraça naquele dia era formado pelo cientista pioneiro Robert Edwards e por Jean Purdy, uma jovem enfermeira e embriologista. Juntos com o cirurgião Patrick Steptoe, o trio teve sucesso com a fertilização in vitro, um método de tratamento da infertilidade. Edwards receberia o Prêmio Nobel posteriormente.
Joy surge em um momento em que a ciência está sob ameaça nos Estados Unidos – até mesmo a FIV –, então é absolutamente inspirador ver cientistas determinados e inteligentes trabalhando arduamente para mudar o mundo. “O que estamos fazendo importa”, diz Steptoe, interpretado com sobriedade por Bill Nighy.
Joy são as histórias pessoais dos três cientistas – principalmente pelos olhos de Purdy, uma guerreira de jaleco. “Se eu ouvir uma confusão, não sou capaz de ficar fora dela”, diz ela. Interpretada perfeitamente por Thomasin McKenzie, Purdy é ao mesmo tempo vulnerável e forte, aprendendo durante o processo a ser um ser humano melhor. James Norton interpreta Edwards com charme, dúvida e calma.
Pecado
O roteiro de Jack Thorne explica bem a imensa pressão que o trio enfrentou. A FIV pode ter se tornado comum e incontroversa nas últimas décadas, mas no final dos anos 1970 era experimental e evitada. A igreja anglicana a chamava de pecado, os jornais a rotulavam de Frankensteiniana e outros cientistas alertavam sobre bebês anormais. “Estão cientes de que vão jogar o livro em nós”, o Steptoe de Nighy diz à equipe. “Nós vamos unir todos contra nós.”
Purdy, uma mulher solteira conforme os anos 1960 dão lugar aos 1970, é exilada por sua própria mãe religiosa – “Você não pode brincar de Deus com isso”, ela diz à filha – e desconsiderada por sua igreja. Não importa. “Esta luta é nossa. Não temos escolha”, diz Purdy. O filme também celebra as corajosas futuras mães que se ofereceram para que seus corpos fossem explorados pela vanguarda da ciência.
Nossos pesquisadores heróis tentam argumentar em vão para o mundo cético que a FIV é simplesmente uma maneira de a ciência ajudar aqueles em necessidade, como óculos para os míopes ou dentaduras para aqueles que perderam os dentes. É notável voltar a esse debate agora, quando as grandes conquistas da ciência podem estar sob ameaça, como a água fluoretada.
O diretor Ben Taylor mantém a história pequena e íntima, uma série de vinhetas que se somam quase como em uma peça de teatro. Apresenta momentos de bravura silenciosa e educada, e pequenas conversas durante um pint de cerveja – um lembrete do poder das atuações e de que mudar o mundo não exige um herói musculoso com visão de raio X. A história é embalada por uma trilha sonora excelente, com seleções inteligentes como Yes We Can Can, de Lee Dorsey, Nobody But Me, de The Human Beinz, e Here Comes the Sun, de George Harrison, cada música encapsulando o momento no tempo, como pérolas em um fio.
Joy não é só alegria. Há frustração, perda e lágrimas ao longo do caminho, mas é um filme triunfante sobre como os seres humanos podem tornar o mundo melhor e como o choro de um bebê pode ser um presente inestimável.