Segunda-feira, 23 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 15 de agosto de 2024
Em sua posse, Milei avisou que a economia ia piorar antes de ver resultados.
Foto: Milan Jaros/BloombergO presidente da Argentina, Javier Milei, passou por mais um teste nessa quarta-feira (14), com a divulgação dos novos números da inflação oficial do país. A inflação na Argentina desacelerou em junho e atingiu o menor patamar no ano, conforme dados do Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Indec, na sigla em espanhol). O Índice de Preços ao Consumidor (IPC) desacelerou para 4%, ante 4,6% em junho.
A variação de preços se mostra estável desde maio, quando recuou para 4,2% — metade do registrado em abril —, em uma sequência de quedas desde o pico de 25,5% em dezembro do ano passado. No acumulado de 12 meses, o índice oficial da inflação argentina recuou para 263,4%, contra 271,5% no mês anterior. Foi o terceiro mês seguido de queda após a variação atingir 289,4% em abril.
Segundo dados do Indec, a queda no mês foi puxada pelo setor de restaurantes e hotéis (6,%), seguido por bebidas alcoólicas e tabaco (6,1%) e moradia, água, energia, gás e combustíveis (6%).
O setor de maior alta em julho foi o de Restaurantes e Hotéis (6,5%). Na sequência, ficaram Bebidas Alcoólicas e Tabaco (6,1%), Habitação, Água, Eletricidade, Gás e Outros Combustíveis (6%), Saúde (5,8%) e Recreação e Cultura (5,7%). A Argentina, sob o comando do presidente ultraliberal Javier Milei, passa por um forte ajuste da economia. O país vinha enfrentando uma forte recessão econômica, e o novo presidente promoveu um amplo corte de gastos públicos.
A consequência é uma intensificação da pobreza no país: são 12,3 milhões dos argentinos abaixo da linha da pobreza (41,7% da população), segundo o Indec. Para a população, as medidas são doloridas. O chamado “Plano Motosserra” — referência ao corte de gastos — determinou uma desvalorização do câmbio, paralisação de obras públicas e o corte de subsídios em tarifas de serviços essenciais.
Em outra perspectiva: a inflação desacelerou, mas a base de comparação também subiu. Desde o início do ano, os preços de água, gás, luz e transporte público estão bem mais altos.
“Não acho que [a inflação] ande de mãos dadas com os aumentos salariais e impostos”, disse à agência de notícias Reuters o cabeleireiro Gustavo García, no mercado central de Buenos Aires. “A inflação cotidiana é muito maior do que 4% ou 5%.”
Em sua posse, Milei avisou que a economia ia piorar antes de ver resultados. Por isso, apesar do custo social, as medidas iniciais elevaram os ânimos do mercado financeiro.
Afinal, como planejado e apesar da impopularidade das medidas, as reservas em dólar aumentaram e a Argentina registrou, no primeiro trimestre, seu primeiro superávit fiscal desde 2008. O superávit acontece quando a arrecadação é maior do que os gastos.
Ainda assim, o câmbio continua instável, o crescimento das reservas não é rápido o suficiente e a dívida pública continua sendo um fantasma para a equipe econômica. Passados sete meses, o fator longo prazo começa a preocupar quem apoiou as medidas de choque de Milei.
O desconforto ficou claro em uma declaração recente do bilionário argentino Paolo Rocca, CEO da Tenaris, fornecedora mundial de tubos para perfuradoras de petróleo. Antes otimista quanto ao ritmo de mudança econômica do país, ele passou a ponderar as expectativas.
“Provavelmente estávamos todos otimistas demais ao pensar que isso [estabilização econômica] poderia ser feito em um prazo mais curto”, disse, durante uma teleconferência de resultados trimestrais.
“A Argentina melhorou bastante em relação ao que estava antes de Milei, mas não o suficiente para dizer que a economia está estabilizada, é confiável e que é vista como sustentável daqui para frente”, diz Adriana, da Bloomberg Economics.
A economista, que monitora de perto a situação do país vizinho, destaca que a dificuldade da Argentina de acumular reservas também se reflete em uma demora do país em deixar de gerenciar o fluxo de capital, como é o caso do controle do câmbio.
“Enquanto o país tiver controle de capitais, investidores vão achar muito arriscado levar dinheiro para lá”, diz. “Dessa forma, e sem acumular reservas, cresce muito a chance de um novo calote da dívida pública no ano que vem.”
O nono e último calote na história da Argentina ocorreu em 2020, quando o país deixou de pagar cerca de US$ 500 milhões em prestações da dívida para os credores que já estavam atrasados, chamados no jargão do mercado de “cupons de bônus”.
Ao FMI, o país deve mais de US$ 40 bilhões — mais que as reservas do país. Os valores são de um programa de empréstimo tomados pelo ex-presidente Mauricio Macri, que se arrasta há anos e cujos acordos foram rediscutidos no início da gestão de Javier Milei.
O resultado foi a liberação de mais US$ 4,7 bilhões à Argentina em fevereiro deste ano. Na ocasião, o FMI informou ter concedido os valores para “apoiar os claros esforços políticos das autoridades e restabelecer a estabilidade macroeconômica” do país.