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Por Redação O Sul | 12 de agosto de 2023
Os integrantes do setor de cartão de crédito ainda estão distantes de um consenso sobre a questão do rotativo, a linha de financiamento mais cara do País que está na mira do governo e do Congresso. A extinção da modalidade, como sinalizou o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, não encerra o debate, que envolve também a possibilidade de se limitar as compras parceladas sem juros, vistas como um subsídio cruzado. As negociações opõem os bancos ao varejo e às pequenas credenciadoras (também chamadas de adquirentes), que temem impacto nas vendas.
A Associação Brasileira de Internet (Abranet), que representa parte das credenciadoras e das empresas que atendem pequenos lojistas e consumidores, manifestou “sua veemente contrariedade ao projeto de encarecer o pagamento parcelado sem juros, que na prática vai desaquecer ainda mais a economia”. Em nota, a entidade defende a livre concorrência e repudia a tentativa de extinção, taxação ou alteração da forma de pagamento.
“Milhões de brasileiros que fazem compras parceladas serão prejudicados. E muitos lojistas dependem de vender parcelado para manterem seus negócios. Metade de todas as vendas em cartão de crédito em 2022 foram parceladas. Foram R$ 1 trilhão em compras parceladas, e isto equivale a 10% do PIB brasileiro”, afirma Carol Conway, presidente da Abranet.
Como seria
Em meio à pressão das instituições financeiras, governo e BC discutem a adoção de um modelo de parcelamento que leve em consideração o tipo de bem a ser adquirido e o prazo da operação.
A diferenciação por linha de produto ocorreria da seguinte maneira: um bem durável, como uma geladeira, poderia ser vendido em um número maior de parcelas. Enquanto que um semidurável, como uma roupa, seria comercializado em menos vezes. Já o prazo da operação teria influência nas taxas. O modelo funcionaria como uma “escadinha”, ou seja, quanto maior o número de parcelas, maior o juro pago pelo consumidor.
O varejo, porém, rejeita a possibilidade de diferenciação de prazos por tipo de mercadoria. “Existem lojas de construção que vendem eletrodomésticos e itens de decoração. Ou supermercados que vendem linha branca. Não é operacional fazer essa segmentação por linha de produto”, disse ao Estadão Jorge Gonçalves Filho, presidente do Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV).
O empresário destacou que o setor já trabalha com a possibilidade de criação de um limite para o parcelamento sem juros, desde que não prejudique os pequenos lojistas, mas refutou essa segmentação por produto: “Nós já comunicamos isso aos bancos”.
Em nota divulgada na última semana, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) afirmou que entende ser necessária “a diluição dos riscos entre os elos da cadeia, hoje concentrados nos bancos emissores, que suportam todo o já elevado custo da inadimplência”.
As instituições financeiras defendem um reequilíbrio da “grande distorção que só o Brasil tem, com 75% das compras feitas com parcelado sem juros”. A Febraban diz, ainda, que busca uma “transição sem rupturas”, a qual incluiria o fim do rotativo e um redesenho das compras parceladas.
Tabelamento
Enquanto o setor tenta encontrar uma solução para o impasse, o Congresso mantém a pressão. O deputado Alencar Santana (PT-SP), relator do projeto que vai receber o conteúdo do Desenrola (programa de renegociação de dívidas do governo federal, enviado originalmente como Medida Provisória), disse que vai propor, no seu parecer, um prazo para a autorregulamentação do segmento.
Se isso não acontecer, o texto vai estipular que o juro do rotativo, hoje em 437% ao ano, seja limitado ao mesmo patamar do cheque especial, que tem taxa anual máxima de 151,8% (o equivalente a 8% ao mês). Santana trabalha com um prazo de 90 dias, a contar da futura publicação da lei.
As instituições financeiras, porém, rechaçam a possibilidade de tabelamento, visão que é corroborada pela Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs). “Se o juro for, hipoteticamente, para 1%, e o risco do cliente for acima dessa taxa, o emissor vai cortar o crédito dessa pessoa, já que ninguém é obrigado a trabalhar em prejuízo”, explicou Ricardo Vieira, vice-presidente da entidade.