Quinta-feira, 31 de outubro de 2024
Por Redação O Sul | 31 de outubro de 2024
O mais novo capítulo da crise diplomática entre Brasil e Venezuela reflete o momento “irracional” pelo qual passa o regime de Nicolás Maduro. Esta foi a avaliação do alto escalão do Ministério das Relações Exteriores após Caracas publicar uma nota com duras críticas ao governo brasileiro e convocar o seu embaixador em Brasília, Manuel Vadell, para consultas.
Na linguagem diplomática, a convocação do embaixador significa uma demonstração contundente de insatisfação com o outro país. O encarregado de negócios do Brasil em Caracas também foi convocado pelo regime, de quem irá ouvir queixas sobre “as recorrentes declarações intervencionistas e grosseiras de porta-vozes autorizados pelo governo brasileiro”.
Ao tomar conhecimento das convocações, diplomatas brasileiros disseram que Caracas “se perdeu na autocracia”. “Não dá pra enxergar racionalidade em uma atitude de romper pontes com o único interlocutor que tem voz perante a comunidade internacional”, avaliou uma fonte no Itamaraty.
Sobre uma eventual reação diplomática do Brasil, a avaliação de momento é de que ela só deve vir no momento em que o nome do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) for atingido pelas críticas do regime, o que ainda não aconteceu.
Nessa semana, durante discurso em seu programa na TV estatal, Maduro atacou diplomatas brasileiros pelo veto ao ingresso de seu país no grupo do Brics e citou o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira. No comunicado de hoje, o governo venezuelano mencionou diretamente o assessor internacional de Lula, Celso Amorim, que classificou como “bobagens” alguns posicionamentos de Caracas contra o Brasil.
“A escalada nos dá a impressão de que pode chegar ao presidente. Quando isso acontecer, se acontecer, não há como não responder”, disse a mesma fonte.
Agravamento na relação pessoal
O episódio, que desagradou ao regime chavista e causou ruídos com o governo brasileiro, marca um agravamento na relação pessoal entre Lula e Maduro, que já vinha enfrentado ruídos ao longo dos últimos meses.
“Com essa resistência do Brasil em apoiar a Venezuela e ela ficando fora dos Brics, a Venezuela vai interpretar isso como uma atuação negativa do Brasil. O governo da Venezuela, o Nicolás Maduro, vai [adotar uma postura de] crítico do governo atual aqui no Brasil”, avalia o diplomata e embaixador Rubens Barbosa.
Segundo Barbosa, o afastamento entre Lula e o ditador venezuelano também pode enfraquecer o canal de diálogo que o mandatário brasileiro vinha defendendo manter aberto com o regime chavista. Essa linha de ação adotada pelo Brasil entrava em conflito com a de democracias liberais, que defendem sanções e isolamento à Venezuela para conter a ditadura no país.
“Tudo que tinha sido construído antes [por Lula], de aceitar a situação [da crise política em Caracas] sem condenar [Maduro], os arranhões à democracia e aos direitos humanos, isso agora se perde”, opina o diplomata.
Lula tinha uma relação de proximidade com o regime bolivariano desde seus primeiros mandatos, quando Hugo Chávez ainda era presidente da Venezuela. Em nome dessa aproximação, o governo Lula atuou para buscar uma solução diplomática em Caracas, mas não obteve sucesso.