Sexta-feira, 17 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 13 de janeiro de 2018
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Um néscio é um sujeito tolo, alienado, que nem sabe que não sabe das coisas do mundo. Mas paradoxalmente tem a mais absoluta certeza que sabe de tudo. Ele está em todos os lugares: na academia (fazendo exercícios, malhando) falando mal dos políticos e dizendo que já não aguenta pagar tanto imposto; nos rádios dando opinião sobre segurança pública, dizendo que tem de matar todo mundo. Enfim, um néscio…é um néscio. Ah: ele também está nos elevadores. O néscio não suporta o silêncio. Tem de falar algo. Cuidado com ele.
O que os filósofos diriam dos néscios? Como responderiam, por exemplo, à pergunta “por que um néscio somente perde a timidez escondido nas redes sociais (ou redes nesciais”?” Por que o facebook é o locus privilegiado dos néscios?
Vamos às respostas dos filósofos:
Parmênides: tudo permanece (inclusive os néscios); Platão: os néscios fazem parte do mundo sensível. Jamais alcançarão o suprassensível. Por isso, para eles, as sombras são a realidade. Não sairão jamais da caverna.
Gorgias de Leôncio, o sofista mais famoso: um néscio é incognoscível e, se for cognoscível, é impossível contar para o vizinho; Santo Agostinho: toma [algum livro] e lê (a frase é autoexplicativa).
Guilherme de Ockham: não há néscios universais; apenas néscios singulares; Maquiavel: atrás de um néscio sempre surge outro. Não deixe nenhum perto de você.
Heidegger: faz parte do modo próprio de ser no mundo o néscio ser assim; há uma pré-compreensão que funciona como um “adiantamento de sentido”: o sentido de quem é néscio sempre chega antes.
Descartes: néscios não possuem cogito, por isso, não existem. Kant: não existe um néscio em si.
Wittgenstein (do Tractatus): se os limites da linguagem são os limites do mundo, néscios possuem apenas um “mundinho”.
Marx: néscios são o lúmpen; não falo deles; com eles não há revolução.
Dworkin: a raposa sabe muitas coisas, o ouriço sabe uma grande coisa, mas o néscio não sabe nenhuma coisa.
E há uma frase famosa atribuída a Martin Luther King: não me preocupa o barulho feito pelos néscios; o que me inquieta é o silêncio dos não-néscios (dos anti-néscios).
Contemporaneamente, os néscios vêm assumindo lugar de destaque em outros campos. Estão na música, iluminando-nos com sertanejo universitário (ou algo do gênero ou espécie). Frequentam demais os programas de debates esportivos. Frases idiotas ou palavras sem sentido são transformados em hits, como “bora” (ou algo tão néscio quanto). Notícias bizarras ocupam o espaço na mente do néscio de forma privilegiada. Os jargões preferidos dos néscios são: “chega de filosofar”; “o mundo deve ser descomplicado”; “parem com essa discussão inútil: vamos ser práticos”…!
Só que o problema da prática é que ela tem a capacidade de anestesiar, de naturalizar, de embrutecer.
Desde já, advirto que toda solução simples para questões complexas é um engodo. E toda postura de se contentar com respostas prontas, argumentos de autoridade e reducionismos revela falta de senso crítico. Uma existência autêntica é feita de esforço, leitura e abertura. Fuja dos néscios. Não seja um deles.
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.