Ícone do site Jornal O Sul

Funcionários da Avianca se equilibram entre o medo das demissões e o desafio de manter as operações da empresa até o leilão

Com dívidas que superam R$ 3 bilhões, a companhia está em recuperação judicial desde dezembro de 2018. (Foto: Arquivo/Agência Brasil)

Todo dia, acordo e venho trabalhar no escuro. Não sei se é meu último dia ou se verei o último voo”, desabafa um funcionário da Avianca Brasil no Santos Dumont, um dos quatro aeroportos onde a companhia ainda opera. Era o meio da tarde de quinta-feira, quando os quatro balcões de check-in e o da loja da Avianca no saguão recebiam poucos passageiros. Ainda assim, o empregado tinha pressa: “Está muito difícil, mas não podemos parar de trabalhar”, encerra ele, frisando que os empregados foram orientados a não comentar a própria situação ou a da Avianca, a quarta maior companhia aérea do país, que atravessa grave crise financeira. As informações são do jornal O Globo.

Os empregados da Avianca vivem entre o drama das demissões e a pressão para não deixar a empresa parar, condição necessária para a realização do leilão de seus ativos, marcado para terça-feira. Com dívidas que superam R$ 3 bilhões, a companhia está em recuperação judicial desde dezembro de 2018. De lá para cá, voa sob forte turbulência. A Avianca viu sua frota encolher de 50 para sete aviões, o que resultou em mais de dois mil voos cancelados desde 8 de abril.

Demissão é rotina. Às vezes, acontece ao longo do dia. Ninguém sabe se está vindo trabalhar pela última vez. Há forte pressão porque a operação é condição para chegarmos ao leilão. No entanto, não temos a quem recorrer dentro da companhia. Não temos informações”, conta uma aeroviária da Avianca no Santos Dumont, pouco antes de ser interrompida por uma colega com o documento de dispensa recém-recebido nas mãos.

Essa funcionária, que assim como os demais prefere o anonimato, lembra que, antes da crise, os irmãos Germán e José Efromovich, donos da companhia, costumavam ir ao Santos Dumont. Germán até fazia atendimento aos passageiros.

Cada avião que deixa a companhia leva empregos a reboque. Em dezembro, a Avianca tinha mais de 5.500 funcionários. Agora, já não divulga o dado atualizado. Só na quinta-feira passada, a empresa dispensou ao menos 160 funcionários, sendo cerca de 75 no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. Houve cortes também no Santos Dumont, em Curitiba e Vitória, segundo os sindicatos dos aeroviários.

Selma Balbino, à frente do sindicato nacional da categoria, conta haver trabalhadores dispensados há 20 dias ou mais e que não receberam os direitos rescisórios. O pagamento de benefícios está atrasado. As demissões estão centradas nos aeroviários, que atuam em atividades em terra, como lojas, check-in e manutenção.

Com os aeronautas, pilotos e comissários que trabalham a bordo dos aviões, a estratégia é outra. Eles não são demitidos, mas ficam com a remuneração reduzida ao salário base e sem voar, explica o Sindicato Nacional dos Aeronautas.

Os funcionários criaram grupos de discussão em aplicativos de troca de mensagens. Um deles já tem mais de 200 integrantes. Segundo funcionários com acesso às mensagens, “oito em cada dez integrantes querem dicas para mudar de emprego”:

Domingo passado, um voo para Brasília decolou com mais de três horas de atraso. A Avianca havia cancelado nosso plano de saúde. Então, a tripulação só decolou depois que o plano foi reativado”, conta a aeroviária do Santos Dumont.

Um piloto que trabalha há mais de 15 anos na Avianca, em São Paulo, relata não ter voado em abril. Até então, fazia ao menos um voo por semana a destinos internacionais, como Santiago e Miami, que foram suspensos. Apesar da incerteza, a companhia pagou a ele em abril um curso de capacitação em Santiago, no Chile, ao custo de US$ 6 mil: “A companhia não vem atrasando salários e segue investindo na formação de quem fica. O problema é que não temos informação alguma sobre qual vai ser o futuro.”

O Sindicato Nacional dos Aeronautas tem organizado feirões de emprego para a mão de obra da Avianca buscar oportunidades em companhias aéreas dos EUA e de países asiáticos. Não é a primeira vez que o Brasil alimenta o mercado de tripulantes no exterior.

Na década passada, após a quebra da Varig, com o mercado de aviação nacional mais restrito, diversos pilotos tiveram de buscar trabalho em empresas estrangeiras. Caso a Avianca seja dividida ou adquirida por uma das outras três grandes nacionais – Latam, Gol e Azul – haverá nova concentração no setor. E o Brasil pode voltar a exportar essa mão de obra.

As lembranças que costuram a história desse mercado – que viu, além de Varig, Vasp e Transbrasil saírem de cena – elevam a tensão entre os empregados.

Procurada, a Avianca informou que está reduzindo o número de funcionários. “A empresa agradece a contribuição, dedicação e profissionalismo de todos os colabores que estão deixando a companhia”.

Na recuperação judicial, os trabalhadores devem ser os primeiros a receber créditos trabalhistas, que serão quitados com os valores arrecadados no leilão. O pregão será na véspera do dia de pagamento dos funcionários este mês.

Sair da versão mobile