Com a definição dos principais quadros da equipe de Ricardo Lewandowski no Ministério da Justiça, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva tenta apresentar uma mensagem de compromisso com o combate ao crime organizado e, assim, mitigar, em ano eleitoral, a má avaliação da gestão petista na área da segurança pública. Para isso, terá o desafio de consolidar o diálogo com parlamentares que cobram um tratamento mais duro em relação à criminalidade.
Avaliações de especialistas e de governistas apontam este como um sinal de alerta na composição do time de Lewandowski: o perfil mais jurídico e menos político pode aprofundar tensões na relação com o Congresso, especialmente com a chamada bancada da bala, como as enfrentadas por Flávio Dino no comando da pasta.
O atual secretário nacional de Segurança Pública, Tadeu Alencar, um ex-deputado do PSB de Pernambuco, dará lugar ao chefe do Ministério Público de São Paulo, Mario Luiz Sarrubbo. Egresso da militância política e partidária no PCdoB, o jornalista Ricardo Cappelli será substituído na secretaria executiva pelo advogado Manoel Carlos de Almeida Neto.
Sarrubbo desagrada a setores mais à esquerda e à direita. Foi dele a decisão de acolher o pedido do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), em dezembro, para rever o arquivamento de representação contra a ex-assessora do Ministério da Igualdade Racial que criticou a “torcida branca” do São Paulo. Em 2021, Sarrubbo processou por injúria e difamação uma procuradora que disse que ele deu “tratamento machista” a uma colega – em uma conciliação na Corregedoria do MP paulista, ele desistiu da queixa-crime no ano seguinte.
No outro espectro político, o futuro secretário foi criticado por classificar os envolvidos nos bloqueios de estradas contra o resultado das eleições, em novembro de 2022 e no 8 de Janeiro, como “organização criminosa”.
Por outro lado, o procurador-geral de Justiça já fez ressalvas a mudanças legislativas que são caras à bancada da bala, como a que prevê acabar com a “saidinha” de presos. “Se a segurança pública fosse só um problema legislativo, já teria sido resolvido há muitos anos”, disse Sarrubbo.
Demandas
Coordenador do grupo Prerrogativas, formado por advogados progressistas, Marco Aurélio de Carvalho afirmou que Sarrubbo tem as credenciais necessárias para lidar com críticas e, concomitantemente, acomodar demandas da esquerda e da direita.
“Ele é uma pessoa do diálogo, mas tem dois desafios: tem que ouvir o campo progressista e os setores mais conservadores. A gente espera que ele ouça os dois lados. O desafio dele vai ser equilibrar (as demandas antagônicas)”, avaliou Carvalho, que foi uma das opções ventiladas pelo PT para substituir Dino na Justiça.
Pelo menos desde 2018, Sarrubbo lidera debates no MP paulista para estabelecer um grupo de controle das polícias. Criado na gestão dele, o Grupo de Atuação Especial da Segurança Pública e Controle Externo da Atividade Policial (Gaesp) atuou para tornar réus policiais militares que participaram da Operação Escudo, no Guarujá (SP), com pedido de análise das imagens das câmeras dos uniformes.
As câmeras explicam em parte a redução da letalidade policial em São Paulo. Desde que chegou ao posto máximo do órgão, Sarrubbo acompanha a diminuição das mortes provocadas por agentes do Estado. Entre 2020 e 2022, foram, respectivamente, 814, 570 e 419 mortes por ano. A Bahia, administrada por petistas há 17 anos, apareceu pela primeira vez como o Estado onde a polícia mais mata: 1.464 pessoas, segundo o último levantamento.
Confiança
Ao definir o número 2 da pasta, Lewandowski repetiu o movimento de Dino de indicar um nome de sua estrita confiança, mesmo sem credenciais de especialista em segurança pública. Almeida Neto foi secretário-geral do Supremo Tribunal Federal (STF) durante a presidência de Lewandowski e chegou a ser cotado para suceder-lhe na Corte.
Os perfis de Almeida Neto e de Cappelli têm diferenças significativas. O futuro secretário executivo é mais discreto e não esboça ambições políticas. O atual número 2, por sua vez, se projetou em Brasília depois de ser escolhido como interventor na segurança pública do Distrito Federal.
O gerenciamento da crise foi considerado satisfatório pelo Palácio do Planalto, e gerou uma espécie de “recall” para Cappelli. Ele foi designado ministro interino do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) após a demissão do general G. Dias na esteira dos desdobramentos de 8 de Janeiro.