Sabia? Gaiato pertence à família de gay. O clã começou com a francesa gai, que gerou a inglesa gay e a portuguesa gaio. De gaio nasceu gaiato. Em todas as línguas, o significado se mantém. É alegre, jovial, brincalhão. Gay tem plural. É gays. Os dicionários registram a forma portuguesa guei. Como as leis, há naturalizações que não pegam. Guei é uma delas.
Voltar atrás
“Bolsonaro voltou atrás na reforma da Previdência”, escreveu o jornal. Voltar atrás? ‘‘É pleonasmo’’, bradaram gregos, romanos, baianos & cia. E explicaram: ‘‘Voltar só pode ser atrás. Como voltar pra frente?’’ A lógica parece perfeita. Mas há um senão. O verbo voltar só adquire o significado de retroceder se estiver acompanhado do atrás. É diferente do subir pra cima e descer pra baixo. Subir é sempre pra cima. Descer é sempre pra baixo. Mas voltar nem sempre é retroceder.
A parte e o todo
A pronúncia de seção e sessão é a mesma. Mas a grafia e o significado não se conhecem nem de elevador:
Seção é a parte de um todo. Quer dizer divisão. No supermercado, há a seção de bebidas, a seção de frutas, a seção de laticínios. Na farmácia, a seção de remédios e a seção de cosméticos. Na loja, a seção de roupas masculinas, a seção de roupas femininas, a seção de roupas infantis.
Sessão é o todo. Dá nome ao tempo que dura uma reunião ou um espetáculo: sessão de cinema, sessão de terapia, sessão da tarde, sessão do Congresso.
Superdica: o todo é maior que a parte. Por isso, sessão tem seis letras. Seção, cinco.
Macete
“Um caso não tem nada…” Ops! Haver ou a ver? Como não confundir as duas formas que soam do mesmo jeitinho? Faça o jogo do troca-troca. Se o a for substituível por que, dê a vez ao a ver. Caso contrário, o haver pede passagem: Este caso não tem nada a (que) ver com aquele. Minha história tem tudo a (que) ver com a de Paulo. Vai haver festa aqui? Na contagem de tempo, o verbo haver indica tempo passado.
Acertar ou acertar
Ganhar, verbo abundante, tem dois particípios – ganhado e ganho. Quando usar um e outro? Ganhado se usa com os auxiliares ter e haver (tinha ganhado, havia ganhado). Ganho tem a vez com ser e estar (é ganho, está ganho). Mas, como é viva que só, a língua muda com o passar do tempo.
Modernamente, há forte preferência pelo emprego de ganho com todos os auxiliares (tem ganho, havia ganho, foi ganho, estava ganho). Uma forma e outra merecem nota 10. Você escolhe. O resultado é um só — acertar ou acertar.
Leitor pergunta
Sempre usei duas negações como nesta frase: “Não tenho nenhum problema com frutos do mar”. Mas muitos me dizem que a dupla não… nenhum é redundância. Com agravante — junto, o casal deixa de ser negação. Vira afirmação. Eles estão certos? — Carlos Andrade, Porto Alegre.
Não. O parzinho não… nenhum é filho legítimo da língua nossa de todos os dias. Um dos empregos do nenhum exige a companhia da negativa anterior. Veja: Não há nenhum projeto concluído na área social. Não houve nenhum atentado durante a semana. Não vi nenhum filme. Fez as gravações sem nenhum problema.
Quem não gosta da estrutura casada tem saídas. Uma delas: trocar o nenhum por algum. Aí se livra das duas negativas: Não existe projeto algum concluído na área social. Não houve atentado algum durante a semana. Não vi filme algum. Fez as gravações sem problema algum.
Conclusão: a língua é um conjunto de possibilidades. A gente pode nadar de braçadas. Basta uma dose de conhecimento. Outra de coragem. E, claro, de ousadia.