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Por Redação O Sul | 13 de junho de 2015
O governo brasileiro suspendeu a importação de maçãs argentinas e promete só rever a decisão se o país vizinho, parceiro do Mercosul, levantar o embargo à carne brasileira vigente desde 2012.
O episódio ganhou contornos de crise e pode contaminar outros setores nos quais há instabilidade nas relações de comércio bilateral, como a indústria automotiva.
Tudo começou quando, no início do ano, agentes sanitários brasileiros identificaram 15 carregamentos de maçã provenientes da Argentina com a presença de uma doença que o governo considera já erradicada no Brasil, aCydia pomonela, conhecida como traça da maçã.
O Brasil propôs a realização de inspeções para avaliar o sistema de mitigação de risco adotado pelo vizinho, mas ficou sem resposta das autoridades de lá por semanas.
Em março, o embargo às maçãs foi formalizado. Só então a Argentina apresentou dados comprovando medidas para resolver a praga e regularizou a situação. O embargo, porém, não foi retirado.
O Ministério da Agricultura brasileiro resolveu só reabrir as compras de maçãs se houver o fim do embargo argentino à carne bovina brasileira.
Apesar de não ser um tradicional comprador de carne brasileira –a Argentina é um dos líderes mundiais de produção de carne bovina–, o país vizinho impôs, em 2012, um embargo ao Brasil, quando exames de laboratório detectaram em um animal a presença do agente causador do mal da vaca louca.
Na ocasião, diversos países suspenderam as importações da carne brasileira, mas esses mercados já começam a ser recuperados. A China liberou recentemente o comércio. Os Estados Unidos devem fazê-lo em breve.
Nesta sexta-feira (12), negociadores brasileiros e argentinos ainda tentavam resolver o impasse.
Na avaliação do governo Dilma, esse embargo ao Brasil é político, e não técnico. Para auxiliares da presidente, a decisão argentina passa uma imagem ruim do país, pois parte de um de seus maiores parceiros comerciais e sócio no Mercosul.
Em conversas entre ministros dos dois países em Bruxelas na quinta-feira (11), a titular da Agricultura, Kátia Abreu, avisou que não fazia sentido para o Brasil o veto ao produto brasileiro. Procurada, a assessoria de imprensa da pasta não se pronunciou sobre o diálogo relatado à reportagem.
Em 2014, a Argentina vendeu para o Brasil quase 50 mil toneladas de maçãs frescas, cerca de US$ 52 milhões.
Automotivo
Enquanto representantes dos dois países tentam solucionar o conflito, rumores de retaliações em outras áreas começaram a ganhar força.
Na Bélgica, onde Dilma Rousseff participou da cúpula entre a União Europeia e o Mercosul, informações extraoficiais davam conta de que os argentinos poderiam impor mais limites à importação de automóveis provenientes do Brasil.
A Argentina também cogita retaliação ao fixar embargo para as cargas do setor automotivo do Brasil, a partir dessa segunda-feira, alegando não conformidades nas embalagens de madeira desses produtos.
O país vizinho representa quase 60% das exportações do setor automotivo brasileiro. Entre janeiro e abril de 2015, foram exportados US$ 1,6 bilhão em automóveis e outros veículos terrestres, incluindo suas partes e acessórios para a Argentina.
Neste ano até maio, o Brasil vendeu para o país vizinho US$ 5,2 bilhões, 16% menos do que no ano passado – o segundo ano consecutivo de queda no comércio entre os dois países. Na comparação com 2013, houve retração de 32% nas exportações brasileiras para a Argentina.
Além dos efeitos econômicos, o assunto é politicamente sensível. Neste ano, haverá eleições argentinas e qualquer turbulência que acentue a crise econômica em território vizinho pode comprometer o desempenho da aliada do PT Cristina Kirchner, que tenta eleger um sucessor de seu campo ideológico.
No ano passado, o PIB da Argentina (terceiro maior parceiro comercial do Brasil) cresceu apenas 0,5% –o dado do PIB do primeiro trimestre deste ano ainda não foi divulgado. (Natuza Nery/Folhapress)