O governo federal pretende colocar em prática este ano um mercado de compra e venda de concessões rodoviárias como parte da solução em contratos por todo o País, muitos dos quais com problemas herdados da crise econômica de 2015-2016 e de um modelo de leilão que privilegiou tarifas mais baixas em detrimento da capacidade de investimento das empresas e da sustentabilidade do negócio.
Com isso, metade das concessões será relicitada: 14 concessionárias, entre 27 contratos, solicitaram adesão ao processo de revisão dos contratos criado no ano passado, de acordo com o Ministério dos Transportes.
Diferentemente de outras alternativas já tentadas, a ideia agora é resolver os problemas com as concessionárias atuais antes de oferecer os contratos a outros investidores. As concessionárias tiveram até o fim do ano passado para demonstrar interesse e aderir ao processo.
É preciso que o ministério aceite essa negociação. Os termos são discutidos e, na sequência, o caso vai para a área de conciliação do Tribunal de Contas da União (TCU). Em um desses casos, o da Concer (a Rio-Juiz de Fora), a pasta já decidiu fazer uma nova licitação. A revisão dos contratos mexe em termos como investimentos previstos.
Três negociações estão mais adiantadas, com os acordos esperando validação pelo plenário do TCU: a BR-101, com trechos no Rio de Janeiro e no Espírito Santo, e a BR-163, em Mato Grosso do Sul.
Terminada essa fase, o governo vai oferecer o ativo “arrumado” em leilão para ver se outros investidores têm interesse em assumir a concessão nos mesmos moldes acordados no TCU. O objetivo é afastar quaisquer questionamentos sobre favorecimento da atual operadora.
No ritmo atual, diz Viviane Esse, secretária de Transporte Rodoviário, será possível lançar ao menos um leilão até o fim do ano e iniciar esse mercado secundário. Caso outro investidor se interesse pelo projeto e se comprometa com uma tarifa de pedágio menor, ficará com a concessão e terá de indenizar a anterior.
“Vamos levar para a B3 o projeto firmado com a concessionária atual e perguntar se alguém topa nas mesmas condições (acordadas no TCU). Dá transparência e cria algo que no Brasil não tem hoje, que é o mercado secundário de concessões. Oferecemos o projeto remodelado sem litígio, porque todo o passado é resolvido”, explica ela. “Mas, sendo a concessionária atual ou uma outra, o importante é que a gente já tem obra no fim deste ano.”
Os planos de colocar ordem nesses contratos não são de hoje. Desde a gestão Michel Temer, tenta-se “salvar”, sem sucesso, as concessões antigas, a maioria realizada no período de forte crescimento econômico dos governos do PT e que naufragaram quando o país entrou em recessão.
Esses projetos exigiam, por exemplo, quilômetros de duplicação. Em 2017, foi aprovada a lei de relicitação, que permitia a devolução amigável do ativo e a realização de novo leilão. Mas não vingou.
Nas negociações, o concessionário deve propor uma tarifa de pedágio menor em relação a outros leilões em andamento. Haverá um degrau tarifário, que possibilita que o valor cobrado dos motoristas aumente à medida que as melhorias forem entregues.
As operadoras vão cumprir o prazo original da concessão, ou seja, o tempo que falta para ela terminar. Além disso, elas terão de iniciar as obras assim que o acordo estiver assinado, porque o projeto e os licenciamentos já estarão prontos. Em troca, terão a extensão do contrato por até 15 anos.
Sócia de Infraestrutura e Regulação do BMA Advogados, a advogada Ana Cândida afirma que a expectativa agora é mais otimista do que em relação ao processo de relicitação:
“O outro caminho seria esperar as concessões terminarem, mas são contratos que já estão em um nível de estresse e judicialização grande, com uma relação muito deteriorada. Isso prejudica a qualidade do serviço público para o usuário, que é o principal afetado. Por isso, chegamos a essa nova alternativa de negociação.”
André Dabus, diretor de infraestrutura da Marsh, corretora de seguros corporativos, afirma que, quando as rodovias forem levadas ao mercado novamente, os novos investidores ficarão atentos aos motivos pelos quais os contratos falharam e se estes foram realmente sanados:
“Quando a concessão é do zero, é sempre um planejamento futuro. Nesse caso, já tem um histórico do passado. A análise de risco é mais simples, mas não deixa de ser feita.”
Já André Paiva, economista e analista da área de Projetos da Tendências Consultoria, acrescenta que a iniciativa do governo é importante para dar segurança jurídica à compra e venda de concessões, como ocorre hoje em negociações privadas.
Se bem-sucedido, o plano do Ministério dos Transportes pode significar R$ 110 bilhões em investimentos nos próximos anos, só nesses contratos. Segundo o governo, isso vai beneficiar a população e impulsionar a economia.
A otimização de contratos, como a iniciativa é chamada na pasta, também é considerada importante para “arrumar a casa” e convencer novos investidores da qualidade da atual carteira de concessões. Afinal, há mais de 20 novos trechos com licitação em andamento.
Na segunda-feira, o assessor especial na Secretaria Especial para o Programa de Parcerias de Investimentos da Casa Civil, Alexandre Carneiro, disse que o Brasil tem mais de 40 projetos a serem leiloados até o fim do ano, com R$ 80 bilhões de investimentos a serem contratados. As informações são dos jornais O Globo e Valor Econômico.