A equipe econômica alimentou expectativas de que o governo federal apresentaria um consistente pacote de corte de gastos para reequilibrar as contas públicas assim que as eleições municipais fossem encerradas. Ventilou-se um cardápio de medidas a ser apresentado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e que poderia gerar economia estimada entre R$ 30 bilhões e R$ 50 bilhões.
Obstinado com a recuperação do grau de investimento, Lula estaria disposto a acatá-las. Findas as disputas regionais, as discussões voltaram à estaca-zero, deixando claro que nada mudou.
Há duas semanas, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, dizia que enfrentar a dinâmica de crescimento do gasto público e seu impacto na dívida pública era algo premente e que estava na ordem do dia do governo. As medidas, segundo ele, seriam submetidas ao Congresso Nacional antes mesmo do envio da reforma tributária sobre a renda.
Na última terça-feira (29), entretanto, o ministro disse que ainda terá muitas reuniões com Lula sobre o assunto e que não há prazo para a apresentação do tal pacote. Afirmou não haver veto do presidente sobre essas propostas, mas evitou fazer qualquer projeção sobre a economia gerada pelas ações a serem adotadas: “Nunca divulguei o número para vocês”. Foi um balde de água fria.
Conforme esperado, o mercado reagiu mal a tanta indefinição e o dólar fechou a R$ 5,76, maior valor desde 2021. No dia seguinte, a ministra do Planejamento, Simone Tebet, tentou apaziguar os ânimos, dizendo que o plano deve ficar para novembro e que a prioridade será rever políticas públicas ineficientes – um ato para o qual, segundo ela, é preciso ter “coragem”.
Haddad, por sua vez, afirmou que a Casa Civil está alinhada com a equipe econômica e que haverá um esforço para compatibilizar os gastos aos limites do arcabouço fiscal. Ao contrário do que se esperava, o desfecho das eleições municipais não fará essa agenda avançar. As vitórias da centro-direita e o desempenho sofrível dos candidatos apoiados pelo PT nas urnas acenderam o alerta para a disputa presidencial de 2026.
Certamente haverá quem defenda aumentar ainda mais os gastos para fazer frente a esse cenário político desafiador. Isso dificulta – em vez de facilitar – os planos da equipe econômica.
Há, por óbvio, motivos externos para a instabilidade da moeda. O dólar se fortaleceu com as indicações do Federal Reserve (Banco Central norte-americano) de que o ciclo de corte de juros nos Estados Unidos não será tão rápido quanto se imaginava. As chances de que Donald Trump vença a eleição presidencial não são desprezíveis, e os planos do republicano de sobretaxar as importações e deportar imigrantes aumentariam a pressão sobre o mercado de trabalho, a inflação e os juros americanos.
Juros, dólar, inflação
Mas o Brasil também tem suas próprias questões internas. A expectativa do mercado para a inflação deste ano já superou o teto da meta, os juros futuros continuam a subir a despeito das sinalizações de aumento da Selic pelo Banco Central e a dívida bruta deve superar o patamar de 90% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2032, fazendo picadinho do arcabouço fiscal.
Por melhores que tenham sido os resultados da arrecadação, não será possível apostar apenas na recuperação de receitas para zerar o déficit primário. O governo, no entanto, não demonstra pressa e afirma que as medidas de corte visam a cumprir a meta de 2026. As poucas ações em estudo e que vêm a público são imediatamente rechaçadas por ministros do governo e parlamentares do PT, quando não desmentidas pela própria Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República.
A resistência de Lula é evidente e ele não parece convencido da necessidade de rever gastos públicos de uma maneira estrutural. Bloqueios, contingenciamentos e pentes-finos em benefícios sociais, previdenciários e assistenciais já não são mais suficientes. E, nessas idas e vindas, o mercado cobra um preço cada vez mais alto, na forma de juros e dólar – basta lembrar que o câmbio estava cotado em R$ 4,85 no final do ano passado.