Domingo, 20 de abril de 2025
Por Redação O Sul | 19 de abril de 2025
O Ministério da Justiça e Segurança Pública defende a verificação etária e a criação de uma central de denúncias para tentar impedir o acesso de crianças a conteúdos inadequados, como o desafio de inalar desodorante que causou nessa semana a morte de Sarah Raíssa Pereira de Castro, de 8 anos, no Distrito Federal.
“Cada vez mais a internet acaba mostrando esse lado: um crescente espaço de conteúdo extremista, discriminatório, misógino, e a gente sabe que não existe uma internet (específica) para crianças e adolescentes. Ela foi criada por adultos e para adultos”, diz a secretária de Direitos Digitais da pasta, Lílian Melo.
A política pública defendida pelo ministério é composta por três medidas: verificação etária, para saber a faixa de idade de quem está navegando, preservando a identidade das pessoas; modernização da classificação indicativa; e criação de canal unificado de denúncias para conteúdos ilícitos.
Lílian prevê que até o final do ano o governo Lula lance a verificação etária da pessoa que está navegando na internet. Uma dificuldade, diz, é que muitas famílias dividem o mesmo aparelho celular, por meio do qual adultos e crianças acessam a internet. Ainda não há detalhes sobre como vai funcionar o mecanismo nem como ele será cobrado das plataformas.
“Nossa ideia é ter recursos, soluções como aplicativos, tokens, biometria facial, para fazer verificação etária. Isso permitiria avaliar se o que está chegando às crianças e adolescentes é compatível com a idade dela. Hoje não existe nenhum tipo de cuidado quanto a isso, existe uma só internet. Mas o Estatuto da Criança e do Adolescente precisa ser aplicado ao (mundo) digital”, diz.
Cássio Maurílio, pai de Sarah Raíssa, cobra a punição de quem lançou o desafio na internet e que os desodorantes passem a conter um alerta de perigo.
“Essas plataformas que estão aí, cheias de crianças assistindo… Por que não têm nenhum filtro?”, questionou, após o enterro da filha. “A criança é criança, é fácil de ser manipulada. Não importa qual rede social, qual plataforma foi. A regulamentação tem que valer para todas.”
Punições severas
Especialistas defendem a necessidade de punições severas para quem propõe e divulga esse tipo de conteúdo e para as plataformas, que podem responder criminalmente por não fiscalizar e vetar na urgência exigida. A ausência de punição, afirmam, tem o efeito de legitimar, por inércia, a repetição dos casos.
Alexander Coelho, sócio do Godke Advogados e especialista em direito digital e proteção de dados, afirma que o desafio do desodorante, por exemplo, envolve condutas com evidente risco à integridade física, especialmente de menores. “Esses conteúdos deveriam ser tratados com a mesma severidade que se aplica à incitação ao suicídio ou à automutilação. No entanto, estamos atrasados em criar um marco legal que dê conta dessa nova realidade digital”, afirma o especialista.
“Infelizmente, na prática, a punição ainda é a exceção. Embora o homicídio qualificado seja juridicamente possível – sobretudo se for comprovado o dolo eventual ou a indução à morte –, a responsabilização criminal direta dos criadores ou replicadores dos desafios encontra obstáculos na apuração da autoria, da intencionalidade e do nexo causal”, afirma.
Ele reforça que as plataformas têm tecnologia suficiente para identificar e barrar conteúdos perigosos antes que viralizem. “Sistemas baseados em inteligência artificial já são capazes de detectar padrões típicos de desafios virais, analisar contextos visuais e linguísticos e bloquear a disseminação desses conteúdos em tempo real.”
Problema global
Na terça-feira (15), a polícia do Rio de Janeiro realizou uma operação contra uma organização criminosa que usava a internet para induzir crianças e adolescentes a propagar crimes de ódio, fazer apologia ao nazismo, divulgar pornografia infantil e maltratar animais. O grupo também induzia as vítimas ao suicídio e à automutilação, e é suspeito de tentativa de homicídio. Ao menos dois homens foram presos e dois adolescentes apreendidos. A ação também ocorreu em outros sete Estados.
O problema dos “jogos perigosos” na internet não atinge somente o Brasil, mas diversos países. Composta por agências de segurança dos Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia, uma rede internacional – que normalmente trabalha em silêncio – pediu publicamente uma ação coletiva, pois: “Menores radicalizados podem representar a mesma ameaça terrorista crível que os adultos”. Com informações do jornal O Estado de S. Paulo