O governo federal avalia criar um mecanismo de financiamento para concretizar ferrovias autorizadas, mas que até agora não saíram do papel. O modelo de autorização para ferrovias permite que qualquer empresa peça consentimento para criar linhas e ganhe sinal verde para construir do zero um empreendimento todo privado.
Isso é diferente das concessões, em que o ativo é público e tem a gestão por um período determinado disputada em leilão. Em vigor desde 2021, o modelo de autorização ainda não tem obras de ferrovias iniciadas.
Em entrevista ao jornal O Globo, o ministro dos Transportes, Renan Filho, afirmou que estuda formas de estimular essas obras, para as quais a falta de recursos é um limitador. Até agora, já foram autorizadas 39 ferrovias, de acordo com dados da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). São projetos de todos os tipos, mas o maior objetivo do marco regulatório é criar shortlines, populares nos EUA, que permitem à iniciativa privada investir em projetos de curta distância.
A autorização apenas dá ao empreendedor o direito de construir e explorar economicamente a ferrovia. Ela não garante que o projeto vai de fato sair do papel.
“A gente tem que criar instrumentos que sejam capazes de, com a lei existente, tirar as obras do papel. Por exemplo, garantir uma linha de crédito específica para uma estrada de ferro que tenha por objetivo retirar veículos pesados das rodovias. A gente está estudando essas frentes. Esse é um caminho”, disse Renan Filho.
O ministro vê num instrumento de financiamento específico para ferrovias uma forma de viabilizar titulares de autorização a atrair outros investidores para o projeto:
“Há áreas em que é preciso garantir condições melhores para investimentos. A infraestrutura é assim. Ferrovias, mais ainda. Os investimentos são pesados, o retorno é muito longo. O fato é que nenhuma autorização saiu do papel.”
O regime de autorização é mais flexível que o de concessão, que, além de exigir leilão, tem regras rígidas para a participação de grupos empresariais e o pagamento de outorgas (contrapartida financeira) à União. Na autorização, a empresa interessada apenas apresenta um projeto para construção ou reabilitação de um trecho ferroviário.
O projeto é aprovado se houver interesse público e se forem preenchidos os requisitos de admissibilidade.
Uma das autorizações já dadas pela ANTT, por exemplo, é o de construção de um trem-bala entre Rio e São Paulo, projeto público aventado na primeira passagem de Lula pelo Planalto e abandonado. A Empresa Brasileira de Trens de Alta Velocidade (TAV Brasil), uma organização privada, obteve da agência para construir a linha de alta velocidade de 380 quilômetros só com recursos privados.
A empresa, no entanto, tem um capital muito baixo e ainda não demonstrou ter como concretizar a obra. Tem três anos para apresentar o projeto de engenharia e as licenças.
Transporte agrícola
Após conseguir uma autorização, uma empresa precisa desenvolver os projetos de engenharia e de viabilidade socioambiental, obter licenciamentos junto aos órgãos competentes, como licença ambiental prévia e buscar financiamento. Renan Filho disse que o governo não pretende, neste momento, alterar as regras ou acabar com a autorização.
O foco é garantir que as ferrovias saiam do papel para atender demandas específicas da economia, como o escoamento de grãos e minérios, particularmente na região central do Brasil.
“A gente não quer mexer na regra das autorizações. A gente quer que as ferrovias se materializem, deixem de ser de papel para se transformar em estradas de ferro. Esse é o desafio. Modernizar o arcabouço a fim de garantir isso é importante. Mas não significa somente mexer na lei. As autorizações são uma boa oportunidade, mas precisam se materializar, porque nenhuma delas saiu do papel.”