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Por Redação O Sul | 25 de julho de 2017
Em uma sala no centro de São Paulo, dois advogados de terno falam durante cerca de duas horas sobre cultivo de maconha. Na plateia, cerca de 40 ativistas e pesquisadores de diversos Estados brasileiros levantam dúvidas sobre o assunto e anotam cada detalhe dos slides projetados na parede.
Eles planejam abrir clubes para plantar maconha no Brasil, apesar de isso ser proibido. A reportagem presenciou a primeira reunião desses cultivadores. Entre eles, há estudantes e ativistas que fazem uso recreativo da erva, pais acompanhados de seus filhos tratados com remédios à base de cannabis e até neurocientistas interessados em estudar a planta.
A intenção deles é levar a cabo, nos próximos meses, o que chamam de “desobediência civil coletiva planejada” e, desta forma, criar um debate na opinião pública e levar a questão sobre a regulamentação do plantio de cannabis para uso pessoal à Justiça. “Nós sabemos que podemos ser presos. Mas quem faz esse ativismo está disposto a correr riscos e lutar até o fim”, diz um dos interessados em participar do cultivo.
Com argumentos que vão da redução de danos ao combate ao tráfico, passando por dezenas de jurisprudências a favor do cultivo caseiro de cannabis no Brasil, usuários e ativistas querem provar que há base constitucional para plantar a erva em grupo. Uma das estratégias estudadas é tentar fazer com o STF (Supremo Tribunal Federal) julgue um caso de plantio coletivo. Para esses grupos, seria alta a chance de que os ministros acabassem liberando o cultivo em associações e fixassem uma nova jurisprudência sobre a droga.
Nos últimos anos, dezenas de habeas corpus foram concedidos a plantadores de maconha no Brasil.
Um desses casos é o de Sérgio Delvair da Costa, conhecido como TCH Procê, que foi preso em Brasília em junho de 2016 com 120 pés de maconha. Ele foi indiciado por tráfico e apologia às drogas. As investigações policiais apontavam que ele distribuía sementes de maconha para todo o Brasil e mantinha um canal no YouTube com vídeos ensinando a cultivar a erva.
Cinco meses depois, Costa foi solto após um juiz conceder um habeas corpus por causa do excesso de tempo para seu julgamento. Agora, o cultivador responde ao processo em liberdade, mas pode voltar a ser preso.
Na Paraíba, a Justiça autorizou o funcionamento do primeiro cultivo de maconha para fins medicinais. A Abrace (Associação Brasileira de Apoio Cannabis Esperança) usa a erva para produzir óleo à base de canabidiol e distribuir o produto a pacientes que sofrem de convulsões.
Mas o advogado e conselheiro da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo) Mário de Oliveira diz que os habeas corpus concedidos a cultivadores de maconha não servem como argumento.
“Jurisprudência é igual receita de bolo: tem pra todos os gostos. Esses habeas corpus não significam que as pessoas foram absolvidas, mas apenas que elas vão responder ao processo em liberdade e que, no fim, poderão ser condenadas e voltar à prisão.”
O presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, Cristiano Maronna, avalia que há riscos em iniciar um plantio para fins não medicinais no Brasil, mas diz que a estratégia dos cultivadores, apesar dos riscos, pode ter resultados favoráveis.