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Guerra dos Seis Dias – o desenrolar

(Foto: Reprodução)

No desenrolar da Guerra dos Seis Dias, o efetivo de militares brasileiros do 20º Contingente do conhecido Batalhão Suez que estavam sitiados em Rafah sob coordenação da ONU, como um divisor físico, com armamento leve e inadequado, mosquetão, Itajubá e pistolas Colt, somente para guarnecer os postos de observações, o portão de acesso às instalações e o Corpo da Guarda, tanto da Companhia de Comando se Serviços (CCSv), como das demais Companhias de Fronteira.

Apreensivos, e sem interferir no desdobramento dos episódios, estávamos em evidente risco de vida, entre dois exércitos em guerra com ataques e contra ataques de extrema violência em terreno descampado sem que qualquer deles fossem nossos inimigos. Durante as intensas investidas do exército Israelense contra as divisões da República Árabe Unida, com violentas trocas de tiros entre os beligerantes, nossa atenção e preocupação estava em nos abrigarmos e, como mero espectadores, acompanhar os movimentos das unidades bélicas, que a todo o momento cruzavam em frente às instalações do Batalhão Suez.

Não conseguíamos nos comunicar distante um metro um do outro, tal era a intensidade do barulho do deslocamento da tropa e blindados israelenses, bem como as investidas da aviação com rasantes ensurdecedores em cima das nossas instalações. Fomos orientados a ir para os fundos do Campo Brasil, embaixo de uma coluna de plantação de eucaliptos, onde foi demarcada uma trincheira que começamos a escavar, a grande maioria com as próprias mãos, de forma a colocar o material em sacas posicionando a beira da vala.

Nesse momento, um caça de fabricação francesa, famoso “Mirage”, em voo rasante, metralha nossas posições e seus projéteis dilaceram os galhos das árvores, os quais se projetavam em cima dos soldados. Quando num dos extremos da vala, na estrada ao lado do Campo Brasil, um tanque israelense Super Sherman cruza próximo da trincheira despejando seus projéteis em nossa direção.

Nessa ocasião foi dada uma série de ordens desencontradas:

– a primeira foi para abrir a trincheira;

– logo após para a tropa se abrigar no interior das barracas, onde a proteção contra tiros dos exércitos beligerantes seria maior, proteção essa devido ao tipo de construção e onde nossos soldados não seriam confundidos com os combatentes locais.

Mais tarde, perto do meio dia, foi recebida, do QG da UNEF, uma ordem determinando que todo o efetivo do Batalhão Suez, estivesse pronto para abandonar o Campo Brasil a partir de zero hora do dia 6 de junho.

Pouco depois foi recebida nova ordem, desta vez determinando que o Batalhão estivesse em condições de abandonar o Campo Brasil em uma hora. Essa foi a última ligação que o Batalhão teve com qualquer outro elemento de fora de campo, em virtude de a estrutura de comunicações da ONU ter sido esfacelada.

Se considerarmos a própria dispersão de tiros, em volta e dentro de nossas instalações, podemos concluir que foi inacreditável termos somente uma baixa fatal e doze feridos com pouca gravidade. Nossas posições foram duramente atingidas de todos os lados por intensos fogos de ambos exércitos beligerantes.

Em Rafah Camp as bombas caíam a esmo sobre as edificações brasileiras, no Campo Brasil, obuses e bombas cruzavam por cima de nossas instalações, atingindo a cidade de Rafah distante à 400m da sede da CCSv. Nós, soldados brasileiros rastejávamos a procura de abrigo para não morrermos. O solo trepidava, o som era ensurdecedor, o cheiro do enxofre da pólvora era insuportável. Após o terceiro dia de conflito, o ar era insuportável, mortos já começavam a deteriorar nos locais onde foram abatidos. Na atmosfera rescendia putrefação de corpos em decomposição ao longo da área do conflito.

O 20º Contingente tornou-se uma tropa estranha e armada em um campo de guerra, com ordens de não atirar, sob hipótese alguma, e a mercê da sua própria sorte, por pura omissão das autoridades brasileiras da época.
A 7ª Cia foi atacada por uma coluna da infantaria da IDF, entraram atirando sem cessar, obrigando os soldados brasileiros a deixarem seus abrigos e sem reagir, foram feitos prisioneiros.

Ultrajados, os militares brasileiros não escondiam suas expressões de raiva, mas resignados mantinham-se em silêncio. Alguns queriam reagir, humilhados que foram, e tirados de suas próprias instalações, com as mãos erguidas atrás da cabeça, foram obrigados a deitarem-se, sob a mira das armas dos soldados das forças israelitas.
Aguardavam simplesmente o momento de morrer.

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