Foram presos os “hackers” que violaram os telefones de várias autoridades, dentre elas o procurador Deltan Dallagnol, da Lava-Jato, e o ex-juiz Sérgio Moro. É uma boa notícia. Ninguém precisa de delinquentes soltos, livres para praticar seus delitos. Mas devagar que o terreno é movediço.
A Polícia Federal só está no começo da investigação. Muita coisa ainda vai aparecer – ou não. Não há porque desde logo chegar a conclusões finais. Segundo o ministro da Justiça Sérgio Moro ficou provado que as gravações foram tomadas ilegalmente – o que ele sempre sustentou – e portanto não valiam. Se não valiam, então não havia porque se preocupar.
Acontece que elas valiam sim, senão como prova de crime, mas como revelações políticas de alta toxicidade. Não há como apagá-las, simplesmente. Nem mesmo quem foi alvo dos ataques cibernéticos nega o conteúdo das conversas – indicação mais do que evidente de que elas de fato existiram.
Por elas, ficamos sabendo que Moro tinha mais do que conversas inocentes com Dallagnol – o ex-juiz dava dicas, passava informações, sugeria providências ao coordenador da Lava-Jato. Houve uma promiscuidade ilegal entre o que cabia ao Estado-acusador (o Ministério Público) e o Estado-julgador (o juiz).
Os quatro “hackers” são os únicos, até hoje, que foram presos por causa de gravações e vazamentos ilegais. Foram incontáveis as vezes em que, pelas conveniências da hora, a Polícia Federal e o MPF – só poderia ser eles – promoveram a divulgação ilegal de diálogos e informações sigilosas, envolvendo indiciados e réus da classe política. Esses vazadores – autoridades do Estado – agiram livremente e nunca foram incomodados. Jamais houve uma investigação, e menos ainda alguém foi preso pelo crime que é o mesmo dos “hackers” meio aloprados de agora.
Dois ou três dias depois das prisões, o ministro Sérgio Moro telefonou pessoalmente a algumas autoridades – juízes, ministros e políticos – avisando-os de que tinham sido vítimas dos “hackers”, e afiançando que iria promover a destruição das provas, por ilegais e inúteis.
Tudo estaria bem, não houvessem duas ilegalidades primárias: a primeira, sendo os inquéritos sigilosos, nem mesmo o ministro da Justiça tem o direito a saber do conteúdo da investigação; não na fase em que está. É uma quebra de sigilo praticada da cúpula da hierarquia e é uma violação explícita da tão decantada autonomia da Polícia Federal. O PT, nos seus 13 anos de poder, não ousou chegar a tanto.
E em segundo, e não menos grave, não é ele quem determina a excludência ou a destruição das provas, mas a Justiça, o Judiciário. Moro parece esquecer, às vezes, que ele não é mais juiz. A instância é outra, é outro poder, são outras as regras. Os longos anos de juizado, o caráter autoritário, a ousadia que vem da popularidade, provoca o açodamento, a queima de etapas que implica na tropelia da lei.
A Polícia Federal, entretanto, em nota oficial, deixa claro que “caberá à Justiça, em momento oportuno definir o destino do material (as gravações e mensagens dos “hackers”), sendo a destruição uma das opções”.