Realizada nesta sexta-feira (24) pela Comissão de Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa, uma audiência pública apontou uma série de dificuldades no processo de implantação do novo sistema de ensino médio nas escolas estaduais do Rio Grande do Sul.
Desde 2019, 264 instituições da rede estão progressivamente adotando em seus currículos escolares as mudanças necessárias à adequação, determinada pelo governo federal e que deve valer a partir do ano que vem para os alunos do 1° ano e até 2024 para todas as turmas no País.
A carga horária terá um total de 3 mil horas ao longo dos três anos. Destas, 1.800 horas serão destinadas para as disciplinas que são obrigatórias da Base Nacional Comum Curricular e 1.200 horas serão destinadas para o aluno decidir, entre as áreas de linguagem, matemática, ciências da natureza, humanas e sociais aplicadas, além da formação técnica e profissional.
No Rio Grande do Sul, as 3 mil horas-aula deverão ser divididas em duas modalidades: formação geral básica (60% da carga horária e é composta pelo currículo obrigatório comum a todos os anos) e itinerários formativos por áreas de conhecimento e de formação técnica e profissional ao menos 49%).
Tais itinerários são compostos por dez opções: Cidadania e Gênero, Educação Financeira, Empreendedorismo, Expressão Corporal, Expressão Cultural, Profissões, Relações Interpessoais, Saúde, Sustentabilidade e Tecnologia.
Depoimentos
A diretora da escola Tuiuti, de Gravataí, Geovana Affeldt, considerou impossível colocar em prática a reforma pretendida, com os problemas crônicos de infraestrutura dos prédios escolares, a carência de professores e falta de recomposição. Ela questionou a elaboração do referencial curricular gaúcho e as suas intenções:
Lembrando que os profissionais de educação não tiveram tempo e nem incentivo para participar de debate sobre o novo ensino médio durante a pandemia, Geovana apelou para um novo processo de elaboração com a participação efetiva dos professores professores e gestores e levando em conta à falta de estrutura das escolas.
Coordenadora do Grupo de Estudos em Políticas Públicas para o Ensino Médio (Geepem) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a professora Mariângela Bairros afirmou que o novo ensino médio está alicerçado em apenas dois pontos, currículo e carga horária, não levando em consideração informações econômicas e sociais do grupo que frequenta as escolas.
Para ela, a reforma está descolada do ensino fundamental e está separada do momento em que vivemos: “Esta proposta não conversa com a realidade, que é de evasão de alunos e drástica redução de docentes”. Mariângela alertou que que, na prática, a reforma aprofunda a desigualdade entre escolas públicas e particulares.
Diretora do Instituto Imaculada de Tapera, outra escola-piloto, Luciana Rizzi considerou a reforma uma “colcha de retalhos”, de difícil implementação e contou que a mudança não foi aceita pela comunidade escolar. Ela também questionou a base teórica do novo ensino médio.
O contraponto ficou por conta do depoimento da diretora da Escola Airton Senna, de Viamão, Niara Cardoso. Ela garantiu que os seus alunos estão “apaixonados” pelos itinerários. “Talvez pela forma como implantamos a reforma aqui na escola”, explicou.
Precariedade
A deputada estadual Luciana Genro (PSol) disse que a Secretaria da Educação (Seduc), ao se manifestar sobre o assunto, não leva em conta a realidade dramática das escolas gaúchas:
“Um drama vivenciado cotidianamente pelos educadores, com seus contracheques sendo reduzidos mês a mês. Ela abstrai que as escolas estão caindo aos pedaços, com infraestrutura precaríssima, que não há instrumentos para atrair os estudantes que evadiram das escolas”.
Sofia Cavedon (PT), coordenadora do debate, anunciou que fará uma apelo à Seduc para que seja adiada a implantação da reforma, prevista para 2022. Ela pediu que todas as escolas-piloto encaminhem à Comissão um balanço do que foi feito nas escolas. Segundo a parlamentar, o colegiado vai propor ao Conselho de Educação uma escuta desses depoimentos, antes de deliberar sobre o novo diferencial curricular.
(Marcello Campos)