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Inércia e planejamento

Após a enchente de 1941 começou a preocupação em conter as aguas do Guaíba. (Foto: Reprodução/AHRS)

Desastres e tragédias acontecem quando o gestor público não aplica sua principal atribuição, prevenção. “Principal causa das mortes e prejuízos é o comportamento humano”. (Rousseau).

Estou muito surpreso com a falta de capacidade dos gestores públicos assim como acontece em toda a sociedade. Vivemos uma fase muito estranha no momento. Porque ouvimos relatos a todo momento de péssimo atendimento na prestação de serviços em todas as áreas, passando por médicos, advogados, professores, atendentes do varejo, serviços públicos e por ai vai. Não tem uma pessoa que não apresente um rol de reclamações quando procuram os vários serviços a disposição da sociedade.

No caso especifico desta tragédia que estamos vivendo no RS, nada funcionou preventivamente. Apesar de termos um arcabouço de leis, decretos, normas e resoluções. O Decreto Estadual 52.701/15 estabelece um programa de limpeza e desassoreamento dos rios no RS. A Lei Federal 12.608/12 estabelece a limpeza de canais e prevenção de desastres ambientais, identificação de áreas de risco, e providencias que devem ser tomadas. Porque os gestores públicos em todos níveis não tomaram as devidas providencias.

O assoreamento dos rios é consequência da falta de gestão do lixo doméstico, onde o plástico e eletro eletrônicos vão parar dentro dos rios, sem falar em moveis e outros eletrodomésticos. Portanto o rio precisa ser dragado regularmente para dar vazão a agua da chuva em grandes precipitações. Por óbvio o rio que estiver cheio de outros materiais que não a agua, vai ficar mais raso e portanto invadir seu leito. Não lembro de ver o canal do Guaíba ser dragado. Cada prefeitura no curso dos rios da bacia do Jacuí deveriam fazer o mesmo.

Após a enchente de 1941 começou a preocupação em conter as aguas do Guaíba e de forma desordenada, Porto Alegre em 1956 começou a aterrar a região que hoje corresponde: da Usina do Gasômetro até o Pontal após o Beira Rio. A avenida Praia de Belas e a rua João Alfredo e rua Washington Luiz eram a beira das águas do guaíba. Portanto diminuímos o tamanho do Guaíba, e ninguém percebeu.

A especulação imobiliária e os interesses públicos e privados estão sempre em discussão nos vários planos diretores que tivemos em Porto Alegre-RS, uma discussão sem fim porque atualmente estamos com um projeto de renovação do plano diretor em tramitação na câmara de vereadores. Por óbvio a questão das enchentes não está na pauta.

Em 1970 quando o DAER autorizou a construção da rodoviária de Porto Alegre-RS neste local deveria prever que poderia haver enchentes. Ou então planejar um plano B, para possíveis ocorrências.
A construção do muro da Mauá (1971 a 1974), em Porto Alegre-RS que foi executado pelo prefeito Thelmo Tompson Flores, o que mais construiu obras de mobilização urbana. Desde então deveria ocorrer a manutenção preventiva das comportas com atualização tecnológica, troca das borrachas de vedação readequação das casas de bombas, etc…Porto Alegre fica em média a 10m do nível do mar, mesmo tendo áreas que chegam a 300 m. Na Holanda (Países Baixos) que está abaixo do nível do mar, desde 1920 construiu diques e tem tecnologia para não deixar o mar do avançar sobre o país. Com certeza nada disso foi feito.

Jose Lutzemberger (1926-2002), em 1974 afirmava: “Todo solo perdido significa uma diminuição na capacidade de a Terra produzir alimentos. À medida que explode a população, implode a capacidade de manutenção dessa população.” O RS tem cada vez mais desmatamento para produção agrícola, pecuária e florestas artificiais com objetivo econômico. Tudo acontecendo sem levar em consideração as questões ambientais.

Ministrei aulas na graduação em instituição de ensino em Cachoeirinha-RS, e por várias ocasiões precisei ir até Gravataí para chegar a faculdade porque o acesso pela Avenida Assis Brasil ficava inundado. Porque ainda não foi construído uma elevada de acesso até a Freeway, que não deve ultrapassar dois quilômetros.

E para finalizar precisamos de luzes como a referida em Carta da Providência (1755) por Jean Jacques Rousseau: “Desastres não são naturais, pois decorrem da negligencia humana aos riscos e as vulnerabilidades”.

Olemar Teixeira – advogado e professor

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