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Inflação no Brasil surpreende, mas não muda cenário do ano

Alta de serviços não deve interferir no ciclo de corte de juros. (Foto: Tania Rego/Agência Brasil)

A inflação oficial brasileira, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), veio acima do esperado em janeiro por analistas, mas não alterou o cenário de desaceleração de preços neste ano.

O indicador abriu o ano de 2024 com alta de 0,42%, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A taxa ficou acima da mediana captada pelo Valor Data, que previa alta de 0,36%. Em janeiro de 2023, a taxa foi de 0,53%.

A alta surpreendeu parte dos economistas, que levantaram pontos de preocupação como a possibilidade de o mercado de trabalho aquecido pressionar a inflação no setor de serviços. Ao mesmo tempo, especialistas ouvidos pela reportagem destacam que o resultado não causará revisões nas estimativas que apontam para a continuidade do processo desinflacionário. No acumulado dos últimos 12 meses até janeiro, o IPCA subiu 4,51% ante 4,62% até dezembro.

“A magnitude da alta [mensal] destoou da expectativa e pode assustar se olhar para a composição sem considerar a sazonalidade”, diz a economista-chefe da CM Capital, Carla Argenta.

Ela usa a inflação de 1,38% alimento e bebidas como exemplo. Embora tenha sido a maior alta nesse grupo desde abril de 2022 (2,06%), o dado foi menos impactado do que se esperava pelo fenômeno climático El Niño. “O efeito do El Ninõ está sobre um subgrupo que abarca arroz e feijão, basicamente, além de frutas e verduras. Mas, apesar de ter potencializado a inflação de alimentação em domicilio (1,81%), não parece ser um problema para os próximos meses. Os efeitos já ficaram majoritariamente no ano passado.”

Impactos

O economista-chefe do Sicredi, André Nunes de Nunes, reiterou que o impacto dos eventos climáticos em novembro e dezembro pode ter começado a se dissipar, o que favoreceu para o resultado do grupo de alimentos em janeiro – o avanço de 1,38% ficou abaixo da projeção, que era de 1,55%. A alimentação no domicílio também ficou abaixo da expectativa da equipe econômica do Sicredi, que apostava em alta de 1,99%.

Laiz Carvalho, economista para o Brasil do BNP Paribas, ressalta que o IPCA cheio acima do esperado em janeiro não muda em nada o panorama. “Continuamos achando que o IPCA deste ano fechará em 3,5%. Muito puxado por bens e pela alimentação em domicílio nas próximas observações. Já estamos vendo uma reversão dessas altas em outros índices.”

A queda de 0,65% nos custos de transporte também ajudou os economistas a manterem o cenário. Depois de altas sucessivas desde setembro, o preço das passagens aéreas caiu 15,22%. Combustíveis também tiveram queda, de 0,39% em janeiro na comparação com dezembro.

Setor de serviços

No entanto, o principal ponto de atenção para o processo desinflacionário, segundo a economista do Itaú Unibanco Luciana Rabelo, é a inflação de serviços, principalmente aqueles mais pressionados por reajustes da mão de obra. O núcleo da inflação de serviços subiu 0,76%.

“Preocupa um pouco, principalmente, se o setor de serviços ficar mais pressionado ao longo do ano devido mercado de trabalho aquecido”, afirma. Por outro lado, ela comenta que a alta vista em janeiro “já estava na conta” e não impacta na projeção do banco de que o IPCA será de 3,6% no fim de 2024.

Julio Hegedus, economista-chefe da Mirae Asset, também aponta a inflação de serviços como um elemento que deve ser acompanhado de perto nas próximas medições. “Temos que ficar atentos aos grupos alimentação e bebidas, despesas pessoais e serviços. A economia está aquecida em serviços de baixa renda. Vai ser um fator de impacto”, diz. “Pode haver alguma pressão de demanda ao longo do ano, até porque os dados de difusão continuam elevados.” O índice de difusão mede a proporção de bens e atividades que tiveram aumento de preços e permaneceu em 65,3% no mês passado, mesmo percentual de dezembro.

Apesar do alerta, há consenso entre os economistas de que nenhum dado do resultado divulgado pelo IBGE vai gerar obstáculos para a continuidade do ciclo de corte de juros promovido pelo Banco Central.

“O resultado dos serviços subjacentes em janeiro não é algo preocupante. Precisamos verificar se o movimento será repetido ao longo dos próximos meses”, afirma a economista-chefe da CM Capital. “De momento, não interfere absolutamente em nada na política monetária. A inércia inflacionária está se mostrando cada vez menor e os impactos sobre os reajustes dos preços administrados também têm sido mais baixos. O que fez destoar foram questões sazonais que devem ser revertidas em breve”, analisa Argenta, que espera cortes sucessivos de 0,5 ponto percentual na Selic até que a taxa de juros caia a 8,5% no fim de 2024.

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