O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, afirmou nesta sexta-feira que o teto de juros do rotativo do cartão de crédito é “talvez o problema mais complexo” que já enfrentou desde que comanda a instituição.
“Talvez, de todos os problemas que eu enfrentei no Banco Central, seja o mais complexo. O que demorou mais tempo para entender, para ver todas as relações de tudo que acontece no mundo dos meios de pagamento, e tentar achar uma solução que não crie nenhum tipo de ruptura no consumo, nenhum tipo de prejuízo aos consumidores, nem para os lojistas. É um tema desafiador. Temos de um lado um pagamento parcelado que, quando a gente pega, em termos de percentual de crédito ele cresceu, embora as prestações não tenham alongado, o volume cresceu muito”, afirmou.
De acordo com Campos Neto, o número de pessoas com três, quatro ou cinco cartões de crédito teve um aumento importante. E ainda ressaltou que o volume de endividamento está menos relacionado à renda e mais ao número de cartões que cada individuo possui.
Sobre chegar a um consenso entre todos os agentes envolvidos no caso, o presidente diz não estar “pessimista”, mas sim “trabalhando”.
“O Banco Central não propôs nada. Eu quero escutar as propostas e ver se podemos pegar alguma coisa das propostas, para ver se a gente acha a um campo comum. Os bancos falam que não tem entendimento se não houver algum tipo de limitação nas parcelas. Do outro lado há um grupo que diz que não há entendimento se houver limitações nas parcelas”, declarou Campos Neto.
Ele afirmou que a preocupação é que surja uma regra que cause uma ruptura no sistema de cartões de crédito, prejudicando o consumidores e varejistas.
Caso não surja uma solução, entra em vigor projeto de lei aprovado pelo Congresso que estabelece um teto de juros, limitando que a dívida a 100% do principal.
Campos Neto explicou que essa regra aprovada pelo Congresso terá pouco impacto prático para reduzir os juros, uma vez que os consumidores passam em média bem menos tempo no rotativo. Segundo pesquisa dos bancos, o tempo médio é de 18 dias.
“A regra é dobrar em um ano, mas ninguém fica tanto tempo no rotativo. O impacto que isso vai ter em termos de juros é bem baixinho, não vai cair muito”.
E complementou:
“Nossa preocupação é vir uma sugestão em algum momento, como a gente falhou em encontrar um acordo, que gere uma ruptura no mercado de cartões”.
Ele afirmou que há uma assimetria entre o custo de oportunidade, que é o risco do vendedor, e o risco do emissor. Isso acaba resultando em um sistema de cartões de crédito cheio de anomalias.
Juro na berlinda
A discussão citada por Campos Neto ocorre após aformação de um grupo de trabalho formado por bancos, bandeiras de cartão de crédito, adquirentes (as maquininhas de débito e crédito), representantes do varejo, além de instituições como a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban). Todos estão debruçados em buscar alternativas para reduzir os juros do rotativo do cartão de crédito.
As discussões já começaram, várias alternativas estão colocadas na mesa, mas ainda não há consenso sobre como isso será feito. De um lado, bancos pressionam para limitar a prática do parcelamento sem juros, comum no Brasil, alegando que isso acaba pressionando os juros no rotativo do cartão. É o que os economistas chamam de subsídio cruzado.
Do outro, varejistas sustentam que o parcelamento sem juros é importante sobretudo para o pequeno comércio. Diante da polêmica, o grupo de trabalho formado por BC e instituições do mercado quer encontrar uma solução até o fim deste ano, prazo estabelecido pelo Congresso para determinação de uma nova proposta. Se não ocorrer um consenso, fica valendo o teto de juro que pode, no máximo, dobrar a dívida inicial ao longo de um ano.