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Justiça Federal de Brasília condena ex-assessor de Bolsonaro Filipe Martins por gesto considerado racista durante sessão do Senado

Justiça concluiu que houve delito previsto na Lei de Crimes Raciais. Punição será por restrição de direitos. (Foto: Reprodução/TV Senado)

O juiz David Wilson de Abreu Pardo, da 12ª Vara Federal Criminal da Justiça Federal em Brasília, condenou o ex-assessor presidencial Filipe Martins por gesto considerado racista durante sessão no Senado.

O caso aconteceu em 2021, durante uma sessão na Casa Legislativa. Então assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência da República, Martins acompanhava a fala do ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo sobre os esforços do Itamaraty para viabilizar a aquisição de vacinas contra a covid.

Durante a fala do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, Martins juntou os dedos indicador e polegar da mão direita de forma arredondada e passou sobre o paletó do terno que trajava.

O gesto foi considerado obsceno pelos parlamentares e também foi associado a uma saudação utilizada por supremacistas brancos, já que a mão posicionada desse jeito forma as letras WP (“white power”, ou poder branco).

A questão foi para a Justiça a partir de uma denúncia do Ministério Público Federal.

Condenação

O magistrado concluiu que a ação de Martins poderia ser enquadrada na Lei de Crimes Raciais — na conduta de “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”.

Assim, condenou o ex-assessor a dois anos e quatro meses de prisão, em regime inicial aberto. Mas converteu a prisão em pena restritiva de direitos:

* prestação de 850 (oitocentos e cinquenta) horas de serviços gratuitos à comunidade;

* pagamento de R$ 1 mil por 14 meses a instituição social indicada pela Justiça;

* pagamento de R$ 8,2 mil como pena de multa;

* pagamento de danos morais no valor de R$ 30 mil.

Cabe recurso da decisão.

Defesa

Nas alegações finais do processo, a defesa negou que Martins tenha feito gesto voluntário com conotação racista ou supremacista branca.

Afirmou também que as imagens usadas no processo, em poucos segundos, não são compatíveis com a descrição trazida pelo Ministério Público Federal.

Sustentou ainda que a perícia não permite concluir nada a respeito da intenção do réu.

Advogados pediram a rejeição da denúncia e a absolvição de Martins, por considerar que não existiam elementos que enquadrassem a conduta no crime.

Juiz

Na decisão, de 81 páginas, da última segunda-feira (16), o magistrado apresentou detalhadamente as provas produzidas a partir das imagens da sessão do Senado.

Para o juiz, ficou demonstrado que “o réu realizou voluntariamente o gesto reputado criminoso pela acusação, não se tratando de ajuste da lapela do paletó”.

“A voluntariedade na realização do gesto é respaldada pela circunstância de o réu olhar para a sua própria imagem, enquanto gesticulava, ao mirar para a tela que transmitia em tamanho maior o Presidente do Senado (com isso, a sua própria, de corpo quase inteiro, sentado em cadeira próxima à parede do fundo)”, declarou.

“Notadamente quando da segunda ocasião, o réu elevou a sua mão direita à frente do corpo e juntou as pontas dos dedos polegar e indicador, mantendo os demais dedos estendidos, e movimentou o conjunto para cima e para baixo, rente ao próprio corpo”, prosseguiu.

“Desse modo o fez, repita-se, direcionando o seu olhar para frente, assim o fixando, precisamente em direção ao local em que se encontrava a tela grande que o exibia de corpo quase inteiro. O movimento para cima e para baixo, mais do que outro efeito, acabando chamando a atenção e o foco de quem assiste exatamente para a forma que o gesto adota”.

A decisão também cita o o grau de provocação do ato e a realização voluntária do gesto discriminatório.

“O alcance da manifestação discriminatória e sua magnitude são evidentes, pois o réu se aproveitou da ocasião de ter sua imagem veiculada pelo sistema de comunicação pública do Senado Federal (TV e internet), para a prática do fato. Então, o meio de divulgação da manifestação discriminatória é relevante, pois o público alcançável é imenso e diverso”, completou.

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