Quarta-feira, 04 de dezembro de 2024
Por Luiz Carlos Sanfelice | 5 de junho de 2024
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Galinha, peixe, lebrão… Colônia gourmet
Na década de 60 ainda morando no interior, antes de mudar para Porto Alegre fiz muitas viagens nas quais levava junto minha mulher que, criada em Porto Alegre, se encantava com os acontecimentos de uma viagem pelas estradas poeirentas ou barrentas de toda região noroeste do RS e das lindas paisagens próximas ao belo rio Uruguai.
Em muitos trechos do curso do majestoso Rio, ele atravessa regiões com pequenas mas lindas montanhas que prestam-lhe um cenário meio Europeu, tipo o curso do Danúbio, proporcionando cenários deslumbrantes. Certa vez rodávamos numa dessas montanhas sob um intenso temporal quando o estrondo espantoso de um raio atinge uma árvore que partiu o tronco em dois e pegou fogo e isso a não mais do que uns 25 metros da caminhonete. Um espetáculo tão lindo quanto assustador, na mais pura manifestação de um fenômeno da natureza. Lindo, mas deu um enorme susto. Muitas casas dos colonos eram na beira da estrada, afastadas 20/25 metros onde algumas vezes o Prefeito mandava patrolar e torná-las um pouco mais transitáveis. Mas de um modo geral eram boas de transitar estando, contudo, sempre atento as valetas que eram feitas pela força da água em fortes chuvas e que atravessavam em bisel a estrada constituindo-se em verdadeiros ‘quebra-molas’. A terra vermelha ficava “um asfalto” na seca e um horror de lisa e escorregadias quando chovia. Eu me criei dirigindo nessas estradas e chuva nunca mudou minha agenda – modéstia a parte eu era muito bom no volante, fosse com que carro fosse.
A gente rodava com a expectativa de quando chegar próximo a um desses moradores da beira da estrada, encontrar por ali galinhas soltas, ciscando na estrada e comendo o que achasse. Era ver um bando (mesmo pequeno) e a adrenalina, até da caminhonete, subia. Sempre tinha uma ou duas ‘abobadas’ que ao invés de correrem para o lado, ficavam correndo no meio da estrada. A gente mirava numa ou nas duas de tal sorte que o eixo dianteiro batesse na cabeça da galinha. Não se passava com a roda por cima. Não! A gente matava a galinha ‘com categoria’. Era bater, parar e “pegar a janta” ainda se debatendo…
Se não tinha galinha durante o dia, tinha lebrão durante a noite. Lebrão (uma espécie de coelho selvagem), também, acho que desnorteado pela luz do carro, ele corria “como o diabo”, desatinado, mas bem no meio da estrada. Não tinha pra ele: era eixo na cabeça sem machucar a carne. Eixo porque eram veículos com chassis, Não monobloco. As vezes se visitava algum comerciante na beira do Uruguai e de lá se trazia sempre um lindo peixe. Coisa de 5 ou 6 quilos. Dourado, Grumatã, Surubi, Piava ou outro tipo. Galinha crioula (caipira) ou peixe fresquinho, sem poluição e agrotóxicos, eram petiscos deliciosos… assim como os lebrões, igual a coelho, gordos de tanto roubar soja ou milho dos colonos…
Na maioria dos vilarejos e pequenos povoados ou cidadezinhas, na época, bastante comuns, os hoteizinhos locais eram de famílias onde, geralmente, a esposa do dono, era ‘a mestre’ da cozinha e, de fato – tem que se reconhecer – comumente descendentes de alemães ou italianas, sabiam fazer cada ‘prato’ de dar ciúmes nos grandes “chefs”. Então quando chegávamos à noitinha nessas pequenas localidades, a gente pedia a elas para preparar “nossa caça” ou “pesca” do dia, o que era feito com eximia categoria e até com certo orgulho, mostrando a nós (da cidade grande) suas qualidades culinárias. E sempre eram pratos deliciosos. Deixaram saudades. Era divertido e tornava a viagem mais agradável… Marcou um tempo da vida.
(Luiz Carlos Sanfelice – advogado – auditor – lcsanfelice@gmail.com)
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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