Sexta-feira, 15 de novembro de 2024
Por Luiz Carlos Sanfelice | 31 de julho de 2024
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Em 29 de abril de 1925, revoltado, Luiz Carlos Prestes, iniciou sua marcha pelo Brasil, com destino inicial para São Paulo onde se juntaria aos outros revoltosos e marchariam para o Rio, para tomar o poder. Sua marcha com todo seu contingente, propositalmente, desviou Ijuí pois na construção da linha elétrica Ijuhy-Santo Ângelo fizera muitos amigos ali. Meu avô materno, na década de 1920, foi um grande empreendedor. O recém criado município de Ijuhy não tinha eletricidade. Meu avô tinha um ‘locomóvel a vapor’ (imagina uma locomotiva maria-fumaça de perna pro ar só que com duas ou três rodas de diferentes tamanhos em cima) Com esse recurso ele tocava a serraria, a fábrica de carrocerias, o engarrafamento, a marcenaria e um frigorífico. Adquiriu um gerador importado da Alemanha que ligado com correia ao locomóvel, passou a gerar eletricidade para seu negócio que estendeu para sua casa, para seus vizinhos e, finalmente para a principal rua da cidade onde o Interventor mandou colocar postes. Assim, após o expediente, ao anoitecer, a eletricidade era transferida para a sua casa, de seus vizinhos e para a rua do Comércio, dos trilhos até a Praça, até as 22 horas. O Interventor Antônio Soares de Barros (Prefeito) conhecido como Coronel Dico, foi o primeiro comerciante do então vilarejo. Era um homem de ação e administrador dinâmico. Ijuí é uma região rodeada de rios e por seus desníveis tem diversas cascatas (cachoeiras). Uma delas no rio Potiribú bem próxima à vila, tinha uma boa altura e bom volume e se prestava para construir uma hidrelétrica. Dito e feito. A Usina pronta gerava uma quantidade de energia 3 vezes maior do que Ijuí consumia, então foi construída uma linha de transmissão dali para Santo Ângelo que comprava esse excedente e cujo engenheiro da obra foi o então Capitão Engenheiro Luiz Carlos Prestes do quartel daquela cidade. Este acontecimento é matéria para outra história.
Então Prestes rumou pelo campo, via “Picada da Conceição” pelo mato, para sair novamente no campo, se desviando de cidades (Cruz Alta-Carazinho-Passo Fundo) e tomar o caminho dos antigos tropeiros que levavam gado xucro daqui para São Paulo. Ele foi perseguido e finalmente confrontado pelas tropas legalistas na remota região nos confins do então grande território do município de Ijuí, já em campo aberto, próximo a um micro povoado chamado “Ramada”. Assim depois de ter seguido pelas trilhas e pelos campos rumando pelo nordeste gaúcho, foi ter seu primeiro ‘encontro de fogo’ e sua 1ª batalha campal, onde de fato muitos morreram, de ambos os lados. As forças legalistas se retiraram e a marcha histórica do Prestes, depois batizada na história como “Coluna Prestes” e ele apelidado de “Cavaleiro da Esperança” fez a mais insólita, desnorteada e desnecessária marcha sem rumo pela América do Sul, caminhando, brigando, fugindo, estuprando e matando, mas com, incrivelmente, bem disciplinada tropa, até ser dissolvida, quando então Prestes até ali um Nacionalista, ‘puto da cara’ virou Comunista, o que foi um ‘prato cheio’ para os russos bolcheviques. Toda esta história da Coluna Prestes é muito bem contada pela competente jornalista Eliane Brum, autora de diversos livros e best-sellers reconhecidos. Li todos.
A batalha da Ramada aconteceu em campo aberto próximo a casa onde morava “seu” Chiquinho Camargo. Quando guri, por volta de 1948, fomos algumas vezes na casa do “seu Chiquinho”, lá ‘pras bandas da Ramada’, no meio de um campo ‘infinito’ a perder de vista e ‘coalhado’ de perdizes, de veados, de lobos-guará, e enormes bandos de Emas (avestruz brasileira). Eu pedia ao ‘seu’ Chiquinho, e adorava ouvi-lo contar sobre “a guerra do Prestes” que ele havia participado… enquanto sua esposa, dona “Milinha” (Emília) cozinhava em fogão de campanha, cozinha de chão batido, um delicioso milho verde… o dia todo, todos os dias… além de insuperáveis quitutes campeiros.
À noite o forte vento minuano correndo solto pelas coxilhas assobiava que nem fantasmas pelas fretas nas tábuas do velho casarão coberto de capim Santa Fé. Deitado de olhos abertos na escuridão absoluta, eu pensava (…e ouvia) o tropel dos cavalos e o tilintar dos ferros em lutas de morte… e os gritos de valentes homens lutando pelo que acreditavam. Belas lembranças das quais sinto saudades…
(Luiz Carlos Sanfelice, advogado, auditor – lcsanfelice@gmail.com)
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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