Corria o ano de 1948 e em julho eu já havia completado 9 anos e estava no 3º Ano Primário do Ginásio Sagrado Coração de Jesus, colégio de Freiras com rígida orientação católica. Logo no reinício das aulas após as férias de julho, fomos informados pelas Freiras que em Outubro daquele ano (daí a 2 meses) aconteceria o V Congresso Eucarístico Nacional, em Porto Alegre, evento monumental para os Católicos do RS e, imagina, passou a ser notícia até no “Repórter ESSO”. Meu pai católico fervoroso era também Vereador naquela legislatura em Ijuí e, como disse que viria com a família para esse evento, o Poder Público Municipal (Prefeitura e Câmara de Vereadores) o credenciaram e incumbiram de representar Ijuí.
Tão grande acontecimento duraria uma semana inteira e teria seu retumbante apogeu no domingo, quando uma excepcional Procissão sairia da Catedral Metropolitana e marcharia ao som de trombetas, hinos, carruagens e pálios dourados ornamentados, estandartes e ´bandeiras das Instituições Católicas, até a área central do Parque da Redenção onde naquela rótula atrás do Instituto de Educação, estaria montado uma enorme estrutura com o Altar-Mór do Congresso, à sombra de uma enorme Cruz de uns 20 metros de altura e uma arquibancada com mais de 100 lugares especialmente reservados para Convidados Especiais, Autoridades e Eminências do Clero, e dali se estenderia até a Av. José Bonifácio onde tem hoje o Monumento ao Expedicionário. E assim foi. Tomaram o cuidado de cobrir com forte estrutura o lago redondo da Fonte Luminosa e a então piscina pública, formando assim uma comprida e larga avenida onde instalaram carreiras e mais carreiras de bancos de tábuas como se toda aquela imensa área fosse a “nave” de uma monumental Igreja a céu aberto.
‘Louco’ pra vir, tenuemente, aleguei que perderia 12 dias de aula. Nem fui ouvido (ainda bem). Então viemos de carro e assisti tudo. No domingo de encerramento aconteceu a esperada Procissão trazendo um riquíssimo Ostensório com a Hóstia Consagrada, que partiu da Catedral. Foi uma coisa majestosa. Para meus olhos de criança foram imagens que gravei com riqueza de detalhes, até hoje, 76 anos depois. Prelados da Igreja em suas vestes protocolares, Generais do Exército com as fardas de gala, Almirantes, Capitães da Armada, todos com suas espadas rutilantes. Corpo Diplomático, todos ostentando galões, estrelas, espadas, chapéus e vestes coloridas de seus respectivos países, encantaram meus olhos. Nunca mais vi nada parecido. Foi tão marcante todo o evento e cantei tanto e com tamanho entusiasmo o seu hino que (podes não acreditar) mas até hoje (2024) aos 85 anos de idade lembro da letra e da música do Hino Oficial do Congresso de 1948.
Começa assim:
“Sob as bençãos do lindo Cruzeiro / Que nos céus do Rio Grande reluz / Dobra a fronte o Brasil altaneiro / Ante a Hóstia de Cristo Jesus”;
E termina assim:
“Porto Alegre cidade formosa / És da glória gaúcha o fanal / Sê também a princesa piedosa / Junto à Hóstia de amor imortal”.
Foi uma viagem memorável e um acontecimento inesquecível. E as aulas perdidas?… recuperadas – fui aprovado para o 4º Ano Primário, em 5º lugar entre 58 alunos. Dois anos depois, em 1950, aconteceu em Roma as celebrações do chamado “ano Santo”, que segundo as tradições da Igreja Católica, acontece de 50 em 50 anos. Minha avó materna, dona Luiza Reginato Bós, então com 62 anos e já viúva há muitos anos, foi de navio para a Europa e para Roma para assistir as solenidades e comemorações programadas, ocasião em que teve a oportunidade de conhecer o Santo Padre, o Papa, o então Pio XII. Passados 50 anos, final do Século XX, ano 2000, novo Ano Santo e eu já, então, com 61 anos, coincidindo, também, com o final do Milênio, notei que as comemorações e celebrações em Roma, não tiveram a mesma publicidade nem o mesmo destaque da imprensa internacional, como foi a do Ano Santo de 1950.
(Luiz Carlos Sanfelice – advogado jubilado, auditor – lcsanfelice@gmail.com)