Sexta-feira, 22 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 30 de outubro de 2024
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Conheci Brasília logo após sua inauguração, em outubro de 1961, quando era a chamada de “Cidade 3 Ds” – Na chegado você ficava “Deslumbrado”, dois dias depois ficava “Decepcionado” e 8 dias depois ficava “Desesperado” para ir embora. Dez anos depois, em outubro de 1971, voltei a Brasília, então para participar do Congresso Nacional de Segurança, Higiene e Medicina do Trabalho e, como Diretor Comercial de uma empresa multinacional fabricante de EPIs, a MSA do Brasil, tínhamos lá um Stand de exposição de EPIs e de instrumentos para monitoração de gases tóxicos, gases combustíveis e de poluentes atmosféricos. Na época o Congresso durava uma semana. Meu papel era atender os visitantes e explicar-lhes sobre o uso e aplicação de cada equipamento ou instrumento.
Era Presidente da República o General Emílio Garrastazu Médici, conterrâneo, gaúcho de Bagé. No meio de uma tarde, imagina quem me aparece por lá. Nada menos que Médici e seus seguranças, e parou no nosso Stand. Eu ‘adorava’ Médici pela sua disciplina, retidão, e uma presença sólida e marcante, mas de um fino trato e de uma educação respeitosa com a gente. Parou, se aproximou e veio me fazer algumas perguntas. Eu “me debulhei” em atenção e respeito. Quando na conversa disse-lhe que era gaúcho, isso quebrou o gelo e a conversa ficou menos formal, mas igualmente séria. Fiquei encantado. Ele perguntou meu nome e ao se despedir me deu um abraço. Nossa!!!… fiquei deslumbrado e ‘não cabia em mim’ de felicidade. Eu tinha 32 anos.
Já aqui no Rio Grande, era Governador o Cel. Engº. Euclides Triches que nomeou Chefe da Casa Civil o Deputado Federal Victor Faccioni, que era meu amigo desde os tempos da política estudantil e quando foi Presidente da UGES me convidou para ser Secretário Geral da entidade. Quando ele assumiu a Casa Civil, me procurou e insistiu para que eu assumisse a Chefia do Gabinete. Não quis, pois já era empregado da MSA onde tinha um salário bem maior que o do cargo oferecido. Conto isso para ilustrar o que aconteceu depois e como conheci detalhes desse acontecimento.
O Presidente Médici, aceitando convite do Governador Triches, decidiu fazer uma visita oficial ao Estado. O Governador mandou preparar um banquete para um jantar formal no lindíssimo Salão Nobre Negrinho do Pastoreio do Palácio Piratini, que foi preparado para o evento. O Serviço, assim como os pratos que seriam servidos, ficaram nas mãos e a cargo do requintado e ainda jovem Hotel Plaza São Rafael.
O jantar transcorria normalmente quando o Victor Faccioni – que em função de seu alto cargo, estava sentado próximo ao Presidente, vai e pergunta-lhe se os pratos eram satisfatórios e se ele estava gostando, ao que Médici respondeu:
“O jantar está excelente, não podia ser melhor”. Faccioni pergunta-lhe: “mas se fosse um churrasco com carne de Bagé”? Médici responde: “Ah, seria insuperável e se vocês fizerem um, eu prometo que venho”. Então o Governador estrilou: “Mas Faccioni como você faz isso? Não temos nem um lugar adequado – veja que sinuca você me colocou”. Faccioni se defendendo diz: “podemos construir um Galpão Tradicionalista”. “Onde?”, pergunta o Governador. “No terreno nos fundos do Palácio, diz Faccioni, onde dona Ana Niederauer Jobim esposa do ex-Governador Walter Jobim, tinha um galinheiro e criava galinhas, naquele tempo. (1947/1951).” Triches aproveitou ‘a deixa’ e disse: “Pois então, Faccioni, você fica encarregado de construir esse Galpão, mas saiba que o Estado não tem dinheiro para isso”. “Dê um jeito”. A bomba caiu no colo do Faccioni. O Presidente só disse: “quando o Galpão ficar pronto, eu venho aqui comer esse churrasco”. Isso ‘liquidou’ o assunto. O Galpão teria que, de algum jeito, ser construído e o Faccioni ‘tinha que se virar e dar conta’. Assunto encerrado.
Na semana seguinte ao jantar o Faccioni se lançou a luta. Não sabia como começar. Não tinha nem ideia de como era, nem de como conseguir construir um Galpão conforme a tradição. Chamou o Glauco Saraiva (autor do icônico poema “Chimarrão) e pediu que o orientasse e lhe desse assessoria na empreitada. E assim, com a ajuda do Glauco e apoio financeiros de empresários, foi construído um típico, autêntico e belo Galpão Crioulo no terreno do Palácio, onde está até hoje e muito tem servido para confirmar, autenticar e cultuar, a força das tradições de nosso Estado.
E, como prometido, o Presidente Médici veio comer o churrasco de inauguração, com carne de Bagé. …e assim caminha a humanidade.
Luiz Carlos Sanfelice, advogado jubilado, auditor
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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