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Lembranças que ficaram (50): a rua Ferreira de Abreu e a felicidade…

Precisávamos achar um lugar para morar. Pois encontramos na Travessa Ferreira de Abreu. (Foto: Reprodução)

No primeiro semestre do ano de 1957, o Hardy Jost e eu éramos colegas no 2º ano do curso Científico do então conhecido colégio Sinodal de Ijuí e combinamos vir fazer o 2º semestre no Julinho, em Porto Alegre.

Nessa época, era quase impossível conseguir vaga no prestigiadíssimo Colégio Júlio de Castilhos, o Julinho, conhecido como “Colégio Padrão do Estado”. Se era assim em começo de ano, quanto mais uma transferência no meio do ano.

Mas nosso conterrâneo deputado federal Alberto Hoffmann conseguiu vaga para nós. Afinal…

No fim das férias de julho, então, o Hardy e eu viemos para Porto Alegre e iniciar aqui o 2º semestre do 2º ano do curso científico. Aqui chegados, encontramos no colégio o Mário Nelson Matte, também ijuiense, que já estudava no Julinho. E os três, hospedados em casa de parentes, precisávamos achar um lugar para morar. Pois encontramos na Travessa Ferreira de Abreu, quase uma continuação da (naquela época) socialmente disputada a badalada rua Augusto Pestana. Ambas corriam paralela a rua Ramiro Barcelos, no coração do bairro Bom Fim, no largo do Pronto Socorro, então “point” da moçada porto-alegrense e trânsito dos Cadetes da Escola de Cadetes e do recém-instalado Bar do Beto – famoso ainda hoje. Conseguimos um belo apartamento de uma senhora já viúva e para lá mudamos. Íamos almoçar no Restaurante Universitário (R.U) e íamos de bonde para o Julinho. Voltávamos de bonde e desembarcávamos na esquina do Pronto Socorro. Era na época um recanto de classe média alta e logo nos enturmamos. E era festa e festa todo fim de semana, porque ali na região morava uma imensa quantidade de meninas “fazendo” 15 anos. Criaram-se amizades (algumas delas permanecem até hoje… e muitas deram em casamento).

Era o início dos chamados “Anos Dourados” e os Conjuntos Melódicos da época animavam todos os bailes da juventude nas diversas Faculdades, na Casa do Estudante e, especialmente, os famosos e disputados “Bailes da Reitoria”, que a gente sempre dava um jeito de ir. Por esse tempo, nasceram o “Bar do Beto”, o “Trailer do Passaporte”, o “Cachorro Quente do Rosário”, o “Viscaya”, o “Barranco”, a “Toca do Ratão” e a socialite churrascaria “Sherazade”, que era do pai do nosso amigo Vicente, a quem ensinei a “guiar” num então belo automóvel sedan “Studebaker”. A gente gostava de ir na confeitaria Maomé e de comprar pão fresquinho na Padaria Cestari, ou depois da sessão das 10, passar no Matheus e saborear um especial bauru.

Fomos assim co-fundadores e participantes dos “Anos Dourados”, que aqui em Porto Alegre vimos “se criar”, dançando ao som de Norberto Baldauf e na voz de Edgar Pozzer e Elis Regina, ou na de Andy Willyans cantando “Love is a Many Splendored Thing”, ou de Emilio Pericolli cantando “Al Di Lá”, ou Nico Fidenco cantando “Amore Scusami”, ou Peppino di Capri cantando “Champagne”, ou Dean Martin cantando “Innamoratta” e ouvindo lânguidos Boleros de Ernesto Lecuona ou Augustín Lara pela Orquestra Românticos de Cuba ou musicas internacionais com as Orquestras de Paul Muriat, James Last, Bert Kaempfert, Glen Müller, Henry Mancini ou Percy Faith.

O Mário, fez Medicina, o Hardy, fez Geologia e eu fiz Direito. Éramos, profundamente felizes e sabíamos disso… e desfrutamos dessa felicidade.
Mas os anos passaram e os acontecimentos se sucederam. Hoje aos 86 anos, o Mário é viúvo, o Hardy, morreu aos 82 e eu, com 85 anos, estou há 64 anos casado com a Lena e vivemos felizes, em Porto Alegre.

E vamos vivendo e esperando que o “O Patrão Velho” lá de cima não tenha nenhuma pressa em nos chamar.

Luiz Carlos Sanfelice, advogado jubilado, auditor – lcsanfelice@gmail.com

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