O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a analisar duas ações que discutem se testemunhas de Jeová podem recusar transfusão de sangue no SUS e se a União deve custear procedimentos alternativos aos religiosos.
O caso concreto envolve episódio em que a União, Manaus e o Estado do Amazonas foram obrigados a arcar com um procedimento diferenciado para uma mulher que, por integrar as Testemunhas de Jeová, não aceita transfusões de sangue.
A despeito de sua especificidade, o assunto, que figura na lista de repercussão geral do Supremo (Tema 952), deve ter impacto substancial nas políticas de saúde pública.
Os ministros vão decidir se há conflito entre o exercício da liberdade espiritual e as obrigações do SUS, levando em conta o número considerável de ações que têm como objeto a garantia de cirurgias e outros procedimentos sem o uso de transfusão de sangue — prática que não é aceita pelos que se identificam como Testemunhas de Jeová.
Na sessão de quinta-feira (8) houve apenas as sustentações orais das partes e dos amigos da corte. O julgamento ocorrerá em data posterior, ainda a ser definida pelo Supremo.
Entenda
O caso ganhou novos contornos a partir da publicação do posicionamento da Procuradoria-Geral da República em setembro de 2023.
O órgão defendeu na ocasião que “há de ser resguardada, pelos que decidirem livremente exercer a sua liberdade religiosa, a recusa ao recebimento de transfusão de sangue em procedimento médico, mas a obrigação do poder público de arcar com tratamento alternativo somente alcança aqueles disponibilizados a todos pelo sistema público de saúde”.
A manifestação é assinada pelo ex-PGR Augusto Aras. Para ele, a União pode ser demandada em ações judiciais envolvendo protocolos alternativos para tratamento no SUS, o que faz parte do debate sobre o direito à liberdade religiosa das Testemunhas de Jeová.
Na ação, a União, o estado do Amazonas e o município de Manaus foram condenados a bancar uma cirurgia de uma paciente Testemunha de Jeová que argumentou pelo direito ao procedimento sem transfusão de sangue.
Além da cirurgia, município, estado e governo federal foram obrigados a arcar com passagens e traslado para outra cidade que tivesse o aparato tecnológico necessário para fazer o procedimento sem a transfusão.
Respingos
O julgamento no Supremo deve ter reflexos em situações laterais, mas que têm relação direta com a garantia dos tratamentos alternativos pelo SUS — e também podem gerar impactos orçamentários significativos, posto que há a necessidade de adquirir, transportar e armazenar novos equipamentos e tecnologias, além de fazer o treinamento dos profissionais de saúde.
O próprio sistema de saúde brasileiro já tem conhecimento sobre o tema, mas sua implementação tem ocorrido, em geral, por via judicial.
Enquanto não há uma definição sobre o tema, hospitais públicos também têm sido condenados a aceitar o tratamento PBM, que usa o sangue do próprio paciente. (ConJur)