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Porto Alegre Livro resgata episódios inusitados das formaturas de Medicina da UFRGS

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Cadeiras vazias na solenidade de 1975, que homenageou médicos já falecidos Acervo Álvaro Roberto Crespo Merlo)

Momentos de irreverência e contestação nas cerimônias de formatura da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) entre 1974 e 1990 são resgatados no livro “Beca, Canudo e Protesto”, da jornalista Elisa Kopplin Ferraretto e do médico e professor Elvino Barros. A publicação tem lançamento na manhã desta quinta-feira (5) no anfiteatro do Hospital de Clínicas de Porto Alegre – rua Ramiro Barcelos nº 2.350, bairro Santana, em Porto Alegre.

Das 10h30min ao meio-dia, os autores estarão local para sessão de autógrafos da obra. Também está programado um encontro de ex-alunos, com presenças confirmadas de nomes como Adamastor Pereira, Valter Duro Garcia, Clotilde Druck Garcia, Gilberto Schwartsmann e Júlio Conte.

A produção se baseou em ampla pesquisa documental e iconográfica, reforçada por mais de 100 entrevistas. Por meio de uma escrita em forma de reportagem, o leitor é transportado para um período histórico de lágrimas e sorrisos, ao longo de 17 anos (11 dos quais sob ditadura militar). Um atrativo especial do livro são QR codes que dão acesso a vídeos de quatro coleções de grau da segunda metade da década de 1980, além de um raro registro em áudio de parte da solenidade de 1975.

O livro é da Editora Libretos e contou com apoio cultural da Associação Médica do Rio Grande do Sul (Amrigs), Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), Fundação Médica (FundMed) e Unicred Porto Alegre.

Tradição e ousadia

Formatura é um rito de passagem que marca a mudança de status para quem recebe o diploma. Tradicionalmente, há todo um protocolo de elementos simbólicos, como uso de toga e participação de paraninfos, homenageados, autoridades acadêmicas e oradores, sob olhares atentos de familiares e outros convidados. O ponto alto é o recebimento do “canudo”, em meio a falas rituais e outras manifestações, tendo como desfecho a habilitação oficial do acadêmico a exercer a atividade para a qual se preparou.

A ausência ou modificação de qualquer elemento nesse universo de simbolismos é capaz de introduzir um novo significado. Na Medicina da UFRGS, diversos profissionais que hoje ocupam posição de destaque na assistência, ensino, pesquisa e gestão em saúde, foram diplomados em solenidades com episódios inusitados em meio ao caráter solene desse tipo de evento.

Os autores do livro mencionam a cerimônia de 1974: “Teve beca e canudo, mas sem paraninfo e homenageados. Foi a forma encontrada por formandos e formandas para protestar contra as condições de ensino, prejudicadas pela implantação da chamada ‘reforma universitária’ pelo regime militar”. O protesto foi notícia nacional. A revista “Veja”, por exemplo, publicou nota acompanhada de uma foto de formatura com os lugares vazios pelas ausências na bancada sobre o palco.

Esse episódio não foi o único. Em 1975, a turma escolheu como paraninfo o professor Sarmento Leite, que havia morrido 40 anos antes. Já os homenageados eram Osvaldo Cruz, Vital Brasil, Carlos Chagas, Adolfo Lutz e Noel Nutel, todos também já falecidos. Em outros anos, formandos escolheram como paraninfo não uma pessoa, mas os prédios da antiga sede da Faculdade de Medicina e de instituições como a Santa Casa e Hospital de Clínicas.

“Em 1979, inconformada com a sequência de protestos, a universidade suspendeu a formatura oficial”, relata o texto. “Os estudantes então organizaram uma solenidade por conta própria na Assembleia Legislativa. O médico Gilberto Schwartsmann, eleito orador da turma, fez um discurso crítico e poético, em forma de versos.”

Já nos anos 1980, além de seguirem sem paraninfo, os formandos aboliram o uso da beca e introduziram elementos lúdicos nas solenidades. A turma de 1985 planejou algo ainda mais distante do protocolo: transformar a formatura em uma peça de teatro, encenando problemas vividos ao longo do curso. A ideia só não foi levada adiante porque o acadêmico que coordenava os ensaios, Júlio Conte, aceitou o convite para encenar no Rio de Janeiro a sua peça “Bailei na Curva”, desabafo de uma geração que acompanhou a ascensão e o declínio da censura – a montagem é apresentada até hoje, com sucesso de público e crítica.

Sobre os autores

– Elisa Kopplin Ferraretto: jornalista, atua na área de Comunicação em Saúde. É autora de “Pery e Estelita na Ribalta do Espaço”, que resgata a história de Pery Borges e Estelita Bell, pioneiros do radioteatro gaúcho. Com o colega e professor Luiz Artur Ferraretto, escreveu “Assessoria de Imprensa: Teoria e Prática” e “Técnica de Redação Radiofônica”. Em 2021, recebeu, da Associação Riograndense de Imprensa (ARI) o Troféu Antônio Gonzalez de Contribuição Especial à Comunicação.

– Elvino Barros: nefrologista, atua no Hospital de Clínicas de Porto Alegre e como professor na Faculdade de Medicina da UFRGS. É também autor, coautor e organizador de livros técnicos da atividade, em uma lista que inclui “Fragmentos da História da Nefrologia Gaúcha”, um resgate histórico de sua especialidade.

(Marcello Campos)

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