Sexta-feira, 10 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 16 de agosto de 2023
A polarização nos temas de segurança pública reflete outras áreas do debate público no País, mas com um viés mais pessoal para a maioria dos brasileiros. Se questões como as privatizações ou o efeito dos juros para o crescimento econômico são teóricas para a maioria da população, o resultado da violência está dolorosamente presente para muitos.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que sempre evitou tomar posição sobre segurança pública, agora se arrisca numa área considerada foco de desgaste para governos de esquerda, não raramente acusados de omissão e permissividade com o crime.
Quando entra no assunto, o petista costuma ser crítico em relação à atuação policial. Foi o caso, por exemplo, de suas declarações na semana passada, em comentário sobre a morte da menina Eloah da Silva dos Santos, de 5 anos, atingida por bala perdida dentro de casa, na Ilha do Governador (RJ).
“Muitas vezes é a própria polícia que atira, ou seja, quando a gente fala assim, as pessoas pensam que a gente é contra a polícia. E não é isso. Não somos contra a polícia, não. Nós queremos policiais bem preparados, bem instruídos e com bastante inteligência. O que não pode é sair atirando a esmo, sem saber para onde atira”, disse o presidente.
As declarações contrastam com o que falam outros políticos, no espectro da direita. Ao comentar operação da Polícia Militar de São Paulo que resultou na morte de 16 pessoas, após o assassinato do soldado Patrick Bastos Reis, da PM paulista, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) elogiou a corporação: “Não houve excesso. Houve atuação profissional que resultou em prisões.”
Na cerimônia de lançamento do Novo Programa de Aceleração do Crescimento, Lula, olhando para o governador do Rio, Cláudio Castro (PL), afirmou que o adolescente Thiago Menezes, de 13 anos, foi assassinado por um policial “despreparado e irresponsável”. Thiago morreu em operação da polícia fluminense na Cidade de Deus, na zona oeste do Rio.
“Precisamos criar as condições para a polícia combater o crime, mas, ao mesmo tempo, essa ser eficaz e saber diferenciar o que é um bandido e o que é um pobre que anda na rua”, declarou o petista.
Percepção
Medo de sair à noite, cuidado ao utilizar o celular na rua, grades nas janelas são algumas das inseguranças com que os brasileiros convivem todos os dias. Com índices de criminalidade equiparados a países em guerra, segundo levantamento da Ipsos, o Brasil ocupa o lugar de quinta nação com maior percepção de violência no mundo.
Nesse contexto, a busca por respostas rápidas e enérgicas é presente entre os brasileiros. Com 44 deputados – 9% da Câmara –, a chamada bancada da bala supera a representação no Congresso da maioria dos partidos políticos. Ao atacar os excessos da ação policial, Lula tenta se afastar da bancada da bala. Isso implicaria apresentar um outro caminho – embora isso não esteja bem claro.
“Esse deveria ser um governo para apresentar uma alternativa, um outro modelo de políticas de segurança, longe do punitivismo populista e do militarismo reinantes”, afirmou Gabriel Feltran, diretor de Pesquisa do Centre National de la Recherche Scientifique e professor titular do Centro de Estudos Europeus e de Política Comparada, da universidade francesa Sciences Po, em Paris.
Na campanha, Lula comprometeu-se a melhorar a formação dos policiais e a investir em segurança. “Vamos contribuir para que Estados cumpram com suas funções para diminuir de verdade a violência. Vamos assegurar recursos ao fundo de segurança pública e ao fundo penitenciário, vamos fazer o fundo funcionar de verdade”, prometeu, em agosto do ano passado.
Confrontado, em abril, com casos de violência nas escolas, Lula apresentou um pacote de R$ 3 bilhões para ações em ambientes educacionais, mas ressalvou que isso não resolve. “A gente não vai resolver esse problema só com dinheiro, elevando o muro da escola, colocando detector de metais”, disse.
Tema de profunda relevância para a vida das pessoas, a segurança pública merece um tratamento sério. O modelo para se sanar essa chaga, no Brasil, ainda não foi encontrado, mas a discussão aberta e franca sobre o assunto precisa estar na mesa.