Terça-feira, 22 de abril de 2025
Por Redação O Sul | 7 de fevereiro de 2023
A “briga” pode ser um prenúncio de crise institucional que vai além da simples piora de expectativas. (Foto: Agência Brasil)
Foto: Agência BrasilO presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) usou a cerimônia de posse de Aloizio Mercadante como presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para subir o tom novamente contra a política monetária conduzida pelo Banco Central (BC).
Desta vez, o presidente criticou a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de manter a taxa Selic em 13,75% ao ano. A decisão em si era esperada, mas o comunicado do BC considera que as expectativas de inflação pioraram, principalmente por conta da perspectiva de gastos públicos mais elevados neste início de governo.
Na carta, o Copom afirma que o índice de preços continua acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta de inflação e, para mantê-lo sob controle, deve manter os juros elevados por um “período mais prolongado”.
“É só ver a carta do Copom para a gente saber que é uma vergonha esse aumento de juros e a explicação que eles deram para a sociedade brasileira”, disse Lula. Não foi a primeira vez que o presidente disparou contra o BC ou a política monetária conduzida pelo economista Roberto Campos Neto.
Lula já falou que a independência do BC é “bobagem”, e reforçou que Henrique Meirelles teve autonomia em seu governo anterior mesmo antes da lei; que a meta de inflação do país, de 3,75%, obriga a “arrochar” a economia brasileira em momento que precisa voltar a crescer; que iria esperar “esse cidadão”, Campos Neto, terminar o mandato para “fazermos uma avaliação do que significou o Banco Central independente”; que Campos Neto quer chegar a uma inflação “padrão europeu”, mas que é necessário chegar à inflação “padrão Brasil”; e que o Brasil tem “cultura” de juros altos, e que o patamar de juros e o comunicado do BC são uma “vergonha”.
O “duelo” ganhou destaque no olhar público justamente por conta da independência do BC. Campos Neto foi indicado pelo governo de Jair Bolsonaro e não pode ser demitido por Lula. A lei “blinda” a instituição de ingerência política, e permite que a atuação seja técnica e focada no combate à inflação.
Para economistas ouvidos pelo g1, alguma tensão entre governantes e um BC autônomo é comum. Isso porque juros mais altos são um freio para a economia, e, por aqui, Lula procura motores para reaquecer a atividade do país.
O que acontece?
Mas a “briga” pode ser um prenúncio de crise institucional que vai além da simples piora de expectativas. O boletim Focus desta semana traz o quarto aumento seguido da inflação esperada para 2023, que chegou a 5,78%. Mas o resultado pode piorar bastante se o governo atacar, de fato, o trabalho do BC.
Para Fábio Kanczuk, chefe de macroeconomia da ASA Investments e ex-diretor do BC, o conflito entre agentes da política monetária e governantes faz parte do trabalho, mas restam dúvidas sobre as reais intenções do presidente.
“Se Lula está precisando de um culpado, tudo bem. Os técnicos ignoram essas declarações e seguem em busca de colocar a inflação na meta. Mas ele pode tomar ações que realmente prejudiquem o funcionamento do BC”, diz.
O economista diz que algumas delas são medidas legítimas. É o caso de uma indicação de equipe de filosofia oposta aos atuais integrantes do BC ao final de seus mandatos. Outras, nem tanto — como forçar demissões, assinar algum decreto que prejudique a autonomia do órgão ou realmente alterar a meta via Conselho Monetário Nacional (CMN).
“Todas essas ações têm efeito de gerar mais inflação. O caminho é o seguinte: o presidente briga, sobe a expectativa de inflação, os juros permanecem mais altos, o presidente fica bravo de novo e fala mais”, afirma Kanczuk.