Sem esconder a sua irritação com os rumos tomados pela CPI que apura irregularidades na Petrobras, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva repreendeu dirigentes e deputados do PT. A atitude, tomada na sexta-feira, em meio ao quinto congresso nacional do partido, em Salvador (BA), foi motivada pela aprovação, no dia anterior e com o apoio do PMDB, da convocação do presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, para que compareça à Comissão.
A medida, aprovada pela CPI, contou com o apoio do PMDB e foi tomada após a divulgação de que o Instituto Lula recebeu, entre 2011 e 2013, cerca de 3 milhões de reais da construtora Camargo Corrêa, alvo da Operação Lava-Jato. Já a empresa Lils Palestras, Eventos e Publicidades, também ligada diretamente ao ex-presidente, ganhou 1,5 milhão de reais da mesma empreiteira. O Instituto Lula, no entanto, alega que as contribuições foram obtidas de forma legal.
“Vocês não podem deixar o PT levar essa ‘bola nas costas’. Será possível vocês não verem que estão querendo nos emparedar? Isso é inadmissível!”, protestou Lula, em conversa reservada com integrantes da sigla. O ex-presidente já prepara uma reação. Já pediu, por exemplo, que deputados aliados formem uma “tropa de choque” para monitorar, na CPI, tudo o que possa prejudicar a ele, ao PT e ao governo da presidenta Dilma Rousseff. “Observem quanto o Instituto Fernando Henrique Cardoso arrecada em doações e também convoquem alguém de lá para a CPI”, recomendou, em referência à fundação mantida pelo líder tucano que presidiu o Brasil de 1995 a 2002.
Telefonemas
O descontentamento com o apoio do PMDB à ofensiva contra o PT na CPI motivou, ainda, um telefonema de Lula ao vice-presidente da República Michel Temer, que também responde pelo comando do partido e pela articulação política do governo. Temer respondeu ter discordado da convocação de Okamotto à Comissão, mas argumentou que a bancada da legenda tem autonomia.
Lula também telefonou para o deputado federal Luiz Sérgio (PT-RJ), relator da CPI. “Como é que você permite chamarem o Okamotto?”, interpelou. “Nós somos da paz, mas eles não deixam a gente em paz. Querem bombardear o PT todo o santo dia”, desabafou o petista.
O presidente do Instituto Lula asseguou que está “à disposição” da CPI da Petrobras. Ele insinuou, entretanto, não ser uma simples coincidência a aprovação de seu chamado à CPI justamente na quinta-feira, data de abertura do congresso nacional petista. “Sempre acontece alguma coisa quando temos reuniões importantes do PT”, observou Okamotto.
Doações
Apesar da contundência nos questionamentos à condução da crise política pelo PT, Lula foi aplaudido de pé pelos participantes do evento, ao anunciar a plataforma digital para recebimento de doações financeiras ao partido. “É Lula, de novo, com a força do povo!”, gritavam os militantes, relembrando o slogan da campanha presidencial de 2006.
Em âmbito interno, o gesto foi interpretado como uma espécie de “prévia” do lançamento da candidatura de Lula à sucessão de Dilma, em 2018, além de um desagravo a ele, por parte dos companheiros de sigla. “É claro que todos iriam manifestar a sua solidariedade a Lula”, frisou o líder do governo na Câmara, José Guimarães (CE). “É necessário que se requalifique a coalizão de governo.”
Durante o evento, Lula deu autógrafos, posou para fotos e pediu que todos peçam o “dízimo” aos militantes para sustentar o PT. O partido, porém, decidiu deixar com o seu Diretório Nacional a decisão sobre doações empresariais, vetadas pela sigla desde abril. O tesoureiro petista Márcio Macedo, por sua vez, já se disse favorável ao recebimento desse tipo de recurso pelos diretórios estaduais e municipais da legenda, como forma de saldar dívidas de campanha.(AE)