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Mais de 200 gaúchos já registraram em cartório sua vontade sobre o uso de imagem pessoal após a morte

Recente comercial com recriação digital de Elis Regina ampliou a discussão sobre o assunto. (Foto: Reprodução)

Em uma época de avanço acelerado no uso de ferramentas de inteligência artificial (IA) na vida cotidiana, uma discussão tem se ampliado: o direito de uso da imagem de pessoas após a morte. O assunto também já se reflete nos cartórios do Rio Grande do Sul, com o aumento da demanda por escrituras alusivas a direitos digitais. Nos últimos três anos, já são mais de 200 atos com tal finalidade, 50 dos quais nos primeiros sete meses de 2023.

Conhecidos tecnicamente como “escrituras declaratórias” ou “diretiva antecipada de vontade [DAV]”, esse tipo de procedimento tem sido cada vez mais comuns nos tabelionatos gaúchos. São documentos destinados à proteção de direitos sobre voz ou imagem, por exemplo, ou mesmo o acesso a senhas de redes sociais (incluindo páginas de influenciadores monetizados por plataformas digitais.

“As escrituras declaratórias são documentos em que as partes declaram fatos que desejam ou que sabem, sob sua responsabilidade civil e criminal”, detalha o presidente da seccional gaúcha do Colégio Notarial do Brasil (CNB-RS), José Flávio Bueno Fischer. “Já as diretivas antecipadas de vontade relatam um conjunto de vontades prévia e expressamente manifestadas pela pessoa sobre certas situações, para que sejam seguidas em caso de incapacitação ou óbito.”

Esses atos podem contribuir para que o indivíduo, ao manifestar em vida a sua vontade, assegure o cumprimento de seus desejos, o que se torna ainda mais decisivo em tempos de inteligência artificial. Vale lembrar a polêmica recentemente motivada por um comercial de televisão no qual a cantora porto-alegrense Elis Regina (1945-1982) teve uma gravação de seu rosto manipulada por computador para que ela aparecesse dirigindo um automóvel, algo que dividiu opiniões – há quem considere o recurso antiético, por não ter contar com a concordância de uma artista já falecida.

O assunto é tema de um projeto de lei no Senado para disciplinar e estabelecer regras para a utilização dessas imagens e recursos, principalmente quando se tratar de pessoas que já morreram. De acordo com o texto, esse uso de imagem por meio de IA só será permitido com o consentimento prévio e expresso da pessoa em vida ou de familiares mais próximos.

A proposta – protocolada pelo senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL) – prevê, ainda, que essa permissão deve ser obtida e apresentada de forma clara, inequívoca e devidamente documentada. E que especifique os objetivos a serem alcançados com o futuro uso de imagens e áudios.

Como fazer

– Para manifestar essa vontade, o interessado deve comparecer a um cartório de notas com seus documentos pessoais. O ato também pode ser realizado de forma eletrônica, por meio da plataforma digital e-notariado.org.br.

– Na opção virtual, o cidadão escolhe o cartório de sua preferência para solicitar o serviço e então é agendada uma videoconferência com o tabelião para que a escritura seja assinada eletronicamente, por meio de certificado digital gratuito, que pode ser emitido por meio do mesmo site.

– Já o testamento público é o documento pelo qual o cidadão declara como e para quem deseja deixar seus bens após a morte. Para realizar o ato é necessária a presença de duas testemunhas, que não podem ser herdeiras ou beneficiadas pelo testamento, sendo também exigidos os documentos de identidade de todas as partes (requerentes e testemunhas).

– A presença de um advogado é opcional. O documento pode ser alterado e revogado enquanto o testador estiver lúcido. A declaração terá validade e publicidade somente após o óbito do testador.

(Marcello Campos)

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