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Mangueira e Salgueiro são as estrelas do primeiro dia de desfiles do Carnaval no Rio de Janeiro

Enredos na Sapucaí homenagearão Arlindo Cruz, Zeca Pagodinho e a Bahia, entre outros. (Foto: Gabriel Monteiro/Riotur)

Um dos principais símbolos do carnaval brasileiro, o desfile das escolas de samba do Rio volta neste domingo (19), a acontecer em fevereiro com lotação esgotada. Devido à pandemia de Covid-19, a festa foi cancelada em 2021 e no ano passado aconteceu em abril, porque em fevereiro o Brasil enfrentava um surto da variante ômicron do novo coronavírus.

O retorno ao calendário oficial aumentou a procura por ingressos. Todos foram vendidos, e cerca de 120 mil pessoas estarão no Sambódromo a cada noite, segundo a Liesa (Liga Independente das Escolas de Samba), que organiza a apresentação. Populares e rivais, Mangueira e Salgueiro são atrações aguardadas no retorno.

Torcedor e integrante do Império Serrano, Arlindo Cruz será homenageado na abertura do desfile pela escola de Madureira (zona norte do Rio). A agremiação volta à elite após dois anos na segunda divisão (2020 e 2022) e se apresenta a partir das 22h. Arlindo sofreu um acidente vascular cerebral em março de 2017. Teve oito veias entupidas – segundo o filho – e ainda tem sequelas graves. Está lúcido, mas só se expressa com a fisionomia.

O enredo “Lugares de Arlindo” usa a canção “Meu Lugar”, um dos muitos sucessos do músico, para contar sua história e passear por Madureira. Entre os seis autores do samba-enredo estão Sombrinha, que fez dupla com Arlindo durante quase dez anos, e Aluísio Machado, que convidou Arlindo para integrar a ala de compositores do Império, na década de 1980.

Aluísio tem 83 anos e terá seu décimo-quinto samba entoado pela escola na avenida. Neste carnaval tornou-se o compositor mais vitorioso do Império, superando o lendário Silas de OIiveira (1916-1972), autor de “Aquarela Brasileira” (1964) e mais treze sambas-enredo do Império.

O samba deste ano será entoado por Ito Melodia, que deixou a União da Ilha após 21 anos. A letra tem uma particularidade: um acróstico que forma, com a primeira letra de cada verso em linha vertical, o nome completo do homenageado: “Arlindo Domingos da Cruz Filho”. Arlindo vai desfilar no último carro, com familiares e amigos.

A apresentação vai proporcionar um reencontro do compositor com Zeca Pagodinho, seu parceiro e amigo. Ambos têm 64 anos. A parceria de Zeca e Arlindo começou há 43 anos – a primeira música composta pelos dois foi “Dez Mandamentos”, gravada em 1981 pelo cantor baiano Walmir Lima.

Por coincidência, já que a ordem de desfile de dez das doze escolas é sorteada, logo atrás de Arlindo virá Zeca, homenageado pela Grande Rio. A escola de Duque de Caxias (Baixada Fluminense) é a atual campeã do carnaval carioca e vai começar seu desfile entre 23h e 23h10.

No ensaio técnico, espécie de treino para o desfile, realizado no domingo passado, Zeca não só compareceu (o que é incomum entre as personalidades homenageadas) como distribuiu cerveja para o público (cerca de 2.500 latinhas, segundo estimativa dos integrantes da Grande Rio que ajudaram na tarefa). Também foram distribuídas bolas de futebol, doces e frutas.

O enredo da atual campeã deve se assemelhar ao do Império no formato: vai retratar os lugares por onde Zeca passou e onde gosta de estar. Um dos principais é seu sítio em Xerém, distrito de Duque de Caxias, sua principal ligação com a Grande Rio. O cantor e compositor é torcedor declarado da Portela e vai desfilar também pela Azul-e-Branca de Madureira , que se apresenta na segunda-feira (20).

Em seguida, virá a Mocidade Independente de Padre Miguel, que vai tratar do artesanato com barro. A escola homenageia Mestre Vitalino (1909-1963), um dos principais escultores com argila do País.

Ele morou em Caruaru e, por conta de seu trabalho, o bairro Alto do Moura passou a concentrar uma comunidade de aprendizes de Vitalino. O trabalho desses artesãos foi reconhecido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), que atribuiu ao Alto do Moura o título de “maior centro de arte figurativa das Américas”.

Tudo isso será retratado no desfile, que vai reunir cerca de 80 artesãos vindos de Pernambuco. O carnavalesco Marcus Ferreira, torcedor da Mocidade, estreia na escola e pela primeira vez cuida sozinho de um desfile do Grupo Especial. Em 2020, em parceria com Tarcísio Zanon, ele foi campeão com a Unidos do Viradouro.

Quarta escola a desfilar neste domingo, a Unidos da Tijuca vai falar sobre a Bahia, ou melhor, sobre a baía de Todos os Santos, em cuja orla ficam Salvador e outras cidades. É a maior baía do Brasil e a segunda maior do mundo, com 56 ilhas.

A mais conhecida é Itaparica. O enredo vai contar histórias e costumes da região. Uma curiosidade é que 10% da sua água é doce, vinda de três rios. Por isso alguns religiosos ligados às religiões afro-brasileiras acreditam que élá se encontramIemanjá, a rainha do mar, com Oxum, a senhora das águas doces.

O Salgueiro será a penúltima escola a se exibir nesta primeira noite de desfiles do Grupo Especial. Com o enredo “Delírios de um Paraíso Vermelho”, a escola da Tijuca (zona norte do Rio) vai combater a ideia de pecado e defender a liberdade de expressão e as minorias, como negros e gays, que são alvos frequentes de preconceito.

No paraíso salgueirense, Adão e Eva serão negros, e as pessoas injustamente condenadas ao inferno serão trazidas de volta à Terra para brincar o carnaval, festa em que todos são livres para serem como quiserem.

O desfile da primeira noite da Sapucaí vai ser fechado pela Mangueira, outra escola a falar sobre a Bahia. Abordará as mulheres negras que foram escravizadas na África e conduzidas ao Estado mítico para os sambistas. Mas nada de relembrar a tristeza da escravidão.

A Verde-e-Rosa vai mostrar que essas mulheres e suas descendentes se tornaram líderes de seus grupos, tendo importância tanto na vida social como nas iniciativas culturais. Tornaram-se rainhas de blocos e afoxés baianos, e depois chegaram ao Rio.

Um exemplo é Tia Ciata (1854-1924), que nasceu em Santo Amaro da Purificação-BA, mudou-se para a Praça Onze, no centro do Rio, e foi uma das responsáveis pelo surgimento do samba carioca. Segundo a letra do enredo deste ano, a Mangueira é “onde o Rio é mais baiano”.

A ministra da Cultura, a cantora Margareth Menezes, intérprete de sucessos como “Faraó (Divindade do Egito)” (1987) e “Dandalunda” (2001), deve desfilar comandando um trio elétrico que vai encerrar o desfile da Verde-e-Rosa.

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