Ícone do site Jornal O Sul

Manhas e artimanhas do chamar

O mercado correu para ajustar apostas em relação ao nível da Selic. (Foto: Marcello Casal/Agência Brasil)

Chamar é verbo pra lá de abrangente. Como coração de mãe, comporta muitos empregos. O Dicionário de verbos e regimes, de Francisco Fernandes, lhe dedica uma coluna. Entre tantas regências, uma responde à dúvida de leitores que ficam confusos quando leem frases como estas:

O livro chama Brás Cubas.

O leitor chama José.

A cidade chama Brasília.

Valha-nos, Deus! É a receita do cruz-credo. “O ouvido dói”, dizem eles. Mas não sabem por quê. Muitos citam textos de Drummond e Álvaro Moreira para exemplificar o transtorno linguístico. E daí? O diagnóstico está claro: a moçada confunde regências. O remédio é entender uma e outra. Depois, dar a César o que é de César. Vamos a elas.

Uma

Dizer o nome de alguém para que se aproxime (verbo transitivo direto): O professor chamou Pedro para dar a resposta. O pai chamou o filho para o abrigo. Chamei Maria em voz alta. Chamamos Pedro na saída da aula.

A outra

Ter nome, apelidar-se, denominar-se (verbo pronominal): Eu me chamo Maria. Ele se chama Pedro. Nós nos chamamos Maria e Pedro. O livro se chama Brás Cubas. O leitor se chama José. A cidade se chama Brasília. Como vocês se chamam? Gostaria de saber como vocês se chamam. Como se chamam os pais de Jesus? Eles se chamam Maria e José.

Drummond

“Mundo mundo vasto mundo,

se eu me chamasse Raimundo

Seria uma rima, não seria uma solução.”

Álvaro Moreira

“Quando eu morrer, com certeza vou pro céu. O céu é uma cidade de férias, férias boas que não acabam mais. Assim que eu chegar, pergunto onde mora lá minha gente que foi na frente. Dou beijos. Dou abraços. E depois? Depois eu quero ir à casa de São Francisco de Assis. Pra ficar amigo dele, amigo de verdade. Tão amigo, tão íntimo que ele há de me chamar Alvinho e eu hei de o chamar Chiquinho.”

Tanto faz

Oba! O Banco Central passou a tesoura na Selic. A taxa encolheu para 6%. Foi aplauso geral. Dinheiro mais barato é pra lá de bem-vindo. Esperamos que caia mais, muito mais. Quando? Enquanto se discutem datas, vale a questão. Juro ou juros? Tanto faz. No singular ou plural, o significado não muda. A concordância acompanha o número: O juro caiu. Os juros caíram.

De papo pro ar

“Jean Willys é condenado a pagar indenização a procuradora do DF por ofensa em rede social”, escreveu o jornal. Leitores indagaram: “Cadê a crase?” Está em casa, de papo pro ar. No caso, não ocorre o casamento de dois aa. Trata-se de uma procuradora entre tantas. Na dúvida, basta apelar para o tira-teima: substituir a palavra feminina por uma masculina. Se no troca-troca der ao, sinal de crase. Caso contrário, o grampinho não tem vez: Jean Willys é condenado a pagar indenização a procurador do DF por ofensa em rede social.

A caminho

O time dos pequenos entrava em campo. Aplausos se ouviam. Vinham dos quatro cantos do estádio. O locutor, entusiasmado, tropeçou no plural. Disse “júniors”. Bobeou. O plural de júnior é juniores. Paroxítona, a sílaba tônica é o (ju-ni-o-res). A abreviatura do sobrenome Júnior: Jr.

Mesmo time

Sênior joga no time de júnior. Um e outro fazem o plural do mesmo jeitinho (seniores e juniores). A sílaba tônica também cai no mesmo lugar – ju-ni-o-res e se-ni-o-res.

Leitor pergunta

Os rackers de Araraquara estão presos nas instalações da Polícia Federal em Brasília. Eles ocupam celas ou selas?

Simão Marcos, Praia Grande

A pronúncia é a mesma. Mas os significados não se conhecem nem de cumprimento:

Cela = aposento, quarto de dormir pequeno, quarto de penitenciária.

Sela = arreio de cavalo.

Conclusão: Os hackers de Araraquara estão presos em celas da Polícia Federal.

Sair da versão mobile