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Manuscritos de Gabriel García Márquez são abertos ao público

Gabriel García Márquez trabalha nos manuscritos de "Cem Anos de Solidão". (Foto: Reprodução)

Gabriel García Márquez (1927-2014) vivia em guerra com os advérbios. Para o autor de “Cem Anos de Solidão”, o uso exagerado desse recurso poluía e travava a narrativa. “Ele sempre dizia isso. E confirmamos essa obsessão quando analisamos seus manuscritos. Suas obras têm várias versões, ele ia corrigindo, editando e escolhendo cada palavra. Era um trabalho artesanal, de carpintaria mesmo”, diz  o escritor e acadêmico porto-riquenho Héctor Feliciano, editor da coletânea “Gabo Periodista” (FNPI).

O método de trabalho do Nobel colombiano poderá agora ser observado e estudado por acadêmicos do mundo todo. Na próxima quarta-feira (21), o Harry Ransom Center, da Universidade do Texas, em Austin, abre para consulta o arquivo que comprou da família do autor por 2,2 milhões de dólares.

Além de máquinas de escrever e objetos de escritório, estarão disponíveis os rascunhos e primeiras versões de dez de seus livros – entre eles “Cem Anos de Solidão”, “O Amor nos Tempos do Cólera” e “O General em Seu Labirinto”. Mais de duas mil cartas permitirão conhecer um pouco da relação de Gabo com outros gigantes da literatura do século 20, como o mexicano Carlos Fuentes, o alemão Günter Grass e o britânico Graham Greene.

Segundo Gabriela Polit, professora de literatura da Universidade do Texas e coordenadora do projeto, os manuscritos são acompanhados de várias anotações que mostram a investigação que Gabo fazia para escolher as palavras a serem usadas.

“Houve polêmica na Colômbia pelo fato de seu acervo vir parar aqui nos EUA, também por conta de suas posições políticas [Gabo era esquerdista e amigo de Fidel Castro]. Mas considero essa uma discussão vazia. Grandes autores latino-americanos também têm acervos aqui, como os argentinos Borges e Cortázar. Suas obras são universais. E é preciso reforçar que não houve leilão. Foi a família de Gabo quem preferiu encaminhar os documentos para cá”, explica.

A Universidade do Texas é reconhecida por ter um dos melhores acervos de documentos relacionados à América Latina nos EUA. A abertura será acompanhada de um seminário internacional (entre 28 e 30 de outubro), cuja fala inicial será do anglo-indiano Salman Rushdie. Participam também a mexicana Elena Poniatowska, a colombiana Piedad Bonnett, seu biógrafo britânico, Gerald Martin, e o filho do escritor, o cineasta Rodrigo García.

Haverá exibição de filmes, com destaque para o recém-lançado documentário “Gabo – The Creation of Gabriel García Márquez”, de Justin Webster, com entrevistas com o ex-presidente americano Bill Clinton [que era fã e amigo de Gabo], a agente espanhola Carmen Balcells e o jornalista americano Jon Lee Anderson. O filme revisita paisagens de sua infância que aparecem nas obras, além de recuperar entrevistas antigas.

“Tento mostrar como os lugares e o contexto em que cresceu marcaram seus livros. Por isso foi importante recorrer à zona costeira da Colômbia”, disse Webstee.

VIGILÂNCIA

A principal peça de destaque da coleção, porém, estará sob alta vigilância. Trata-se do manuscrito de sua novela inacabada, “Em Agosto Nos Vemos” (leia ao lado), cuja edição não era desejada pelo autor. A família, em respeito à sua vontade, decidiu que a obra não será publicada, mas estará disponível para consulta fisicamente.

“Estará aqui para quem quiser ler. Mas os papeis não podem ser copiados nem fotografados. Já fazemos isso com outros documentos, mas no caso do Gabo vamos reforçar o controle. Não pode haver cópias.”

Também a partir de quarta-feira (21), será possível consultar o inventário dos documentos on-line. Para isso, basta acessar o site www.hrc.utexas.edu.

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