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Mãos limpas aqui e lá

(Foto: EBC)

A corrupção era o que predominava. A lei tinha um limite de valia. Organizações contralegais repartiam um território do sul da Itália e sobrepunham-se as autoridades, que as temiam; com elas, se associavam ou por intermédio de familiares as comandavam. Esse era o código sul da Itália. Não se distinguia entre quem era bandido e quem (formalmente) devia prendê-lo ou processá-lo.

As organizações mafiosas, que dividiam as áreas “per capita” institucional, se associavam (na verdade, comandavam) a vida econômica, as organizações financeiras, tinham sob seu comando o poder judiciário e seus figurões que, camuflados (nem tanto), estavam no altar diretivo do poder máximo. Suas eram as grandes empresas que, costumeiramente, venciam as “fraudadas” concorrências, desde para um implante de rodovias até a edição de livros didáticos, construção de hospitais, setores específicos da produção de medicamentos, bem como influíam no futebol empresarial.

Apesar da Casa Nostra, da Máfia, etc., e de suas similares, usando também outras áreas, mas vizinhas, enfrentarem o poder público e, com sua violência armada e sua influência dominadora das instituições “donas” do poder (Igreja, partidos políticos, produção privilegiada de bens altamente rentáveis, forças públicas, etc.) o aparelho público foi travestir-se (como um gato de rabo de fora) e se despertou uma reação da sociedade de contrariedade, mesmo sendo frágil.

Foi quando a instituição italiana, similar ao nosso Ministério Público, dispôs-se a “limpar” a sociedade, liberá-la, impedindo que se visse submissa aos gângsteres (e já ocorriam casos de morte por causas naturais de um capo e a louvação das grandes hierarquias religiosas: bispos, arcebispos e cardeais).

O confronto da justiça com os “acima da lei” foi travado de arma na mão, com feridas e até mortes. A operação do Ministério Público, que se chamou Mani Pulite (mãos limpas), mostrou que a luta contra os criminosos obrigava o Ministério Público (sobretudo por ser ele composto de corajosos moços comprometidos com a ideia da limpeza geral) a uma ação permanente e eficaz. Custou, ao se jogarem a empreitada perigosa, que estivessem plenamente crentes da ideia de Churchill quando decidiu ir à guerra, e lembrou: “pode custar sangue, suor e lágrimas”.

Claro que ainda existem gângsteres no Meridião italiano. No entanto, têm uma influência totalmente apequenada. A vitória da justiça também custou vidas, como a do líder da ação corajosa (morreu quando explodiram o seu carro com ele dentro ao passar por uma ponte perto de Nápoles). No entanto, hoje, a Itália é outra. Seu povo é quem o diz.
E o Brasil?

Depois de se calar a operação Lava Jato, que fez, a vista da sociedade, uma ação coletiva de grande completude nacional contra a corrupção, que a comunidade acreditava que era grande mas não sabia o quão enorme ela era, fez-se, trilhando um caminho similar ao das “mãos limpas”, uma investigação, além fronteiras estaduais, procurando delinquentes onde estivessem. Mas, no território da administração pública brasileira, apareceu uma corrupção na qual estavam envolvidos as mais altas figuras da república, segundo está escrito em sentenças não só de primeira instância (juízo individual), mas também – e destacadamente – de segunda instância (tribunal coletivo).

Mas o Brasil, não; os que se apropriaram desonestamente do dinheiro público, em grande parte sendo agentes públicos, foi saqueado por dentro na medida em que o juiz e o promotor público, líderes da Lava Jato, ação de Limpeza Pública (eleitos: senador e deputado com as maiores votações populares, mostrando que o povo apoiava e acreditava na Lava Jato), sentiram que havia clima para dar andamento ao processo investigatório.

Absurdamente, o nosso poder legislativo, que devia prosseguir com as investigações, já que as suspendendo beneficiavam os condenáveis, FEZ PIOR: caçou os membros mais ousados e mais competentes na investigação, que foram eleitos para o parlamento com uma consagradora votação popular, deixando a marca que a opinião pública concordava com o que eles tinham feito.

No entanto, assim como a Itália é outra (já disse linhas acima) com as mani pulite, o Brasil, destruindo a Lava Jato e punindo seus autores, é o mesmo de sempre. É bom que o povo saiba e se rebele.

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